6.2 (cont.)
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Caetano Alberto Munhoz (Fonte: "Retrospectiva Histórica da Secretaria da Justiça"- Curitiba, 1976- p. 115) |
Caetano Alberto Munhoz, o segundo filho de CJM, nasceu em 19
de outubro de 1847 e faleceu em 2 de maio de 1907 (96). F. Negrão informa que ele foi nomeado em 1870
para o cargo de 2º escriturário da Tesouraria de Fazenda do Pará,
transferindo-se em 1873 para a Tesouraria do Paraná já como 1º
escriturário. No começo de 1881, o
governo imperial o nomeou, em comissão, Inspetor do Tesouraria de Fazenda de Mato
Grosso, sendo depois removido para a Alfândega
de Santos e nomeado, por decreto de 1º de julho de 1890, Inspetor, em comissão,
da Alfândega de Paranaguá. Aposentou-se em 1892, quando exercia o cargo de Inspetor
da Tesouraria de Fazenda de S.Paulo. Ainda nesse Estado, foi sub-diretor da
empresa “Docas de Santos” (97).
Depois de aposentado exerceu o cargo de Secretário do Interior, Justiça e
Instrução Pública. Segundo Ermelino de Leão (de cujo “Dicionário Histórico e
Geográfico” é um verbete), Caetano Alberto exerceu esse cargo durante um
quatriênio (governo Xavier da Silva/Vicente Machado) inclusive “no agitado
período revolucionário de 1893-1894, sem chamar a si odiosidades”. Permaneceu no
Paraná durante esse período, “sem ser molestado”, após a “precipitada retirada
para São Paulo” de Vicente Machado (98).
F. Negrão acrescenta a esses dados a informação de que Caetano Alberto,
revertendo à Fazenda, faleceu no exercício do cargo de Delegado Fiscal do
Tesouro Nacional em Curitiba. Era coronel da Guarda Nacional (99). Publicou diversos trabalhos
relacionados à sua área profissional, além de uma comédia, quando jovem (“Antes
do baile”). O escritor Alcides Munhoz (1873-1930) é filho de seu primeiro
casamento. Alcides, por sua vez, é pai do advogado e ex-deputado estadual
Laertes Munhoz (1900-1967), presidente da Assembleia Legislativa em 1953, no
ano do centenário do Paraná.
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Alcides Munhoz (Fonte: Museu Paranaense) |
Seguem abaixo algumas referências a Caetano
Alberto que encontrei na pesquisa que fiz no jornal “Dezenove de Dezembro”.
Embora se refiram mais às sçuas atividades juvenis e ao início da vida
profissional, representam informações adicionais ou complementares àquelas que
já reunimos aqui, e que fornecem pistas para uma caracterização da sociedade
paranaense no tempo do Império.
Caetano fazia teatro
aos 17 anos. Em 1864, nota do DD sobre “teatro de moços” refere-se ao sr.
Caetano Alberto, um dos atores, e também ao teatro Sete de Setembro bem como à Sociedade Dramática
Particular. Eles levaram à cena “Casamento e despacho” de Antonio Serpa e “O
novo Otelo” do “nosso maviosíssimo Macedo” (100),
ou seja, de Joaquim Manoel de Macedo, o autor de “A Moreninha”, que também
escreveu para o teatro.
Quatro anos depois, em
1868, o mesmo jornal publica matéria, intitulada S.D.P.Phenix (Sociedade Dramática Particular Phenix), assinada pelo
diretor Júlio Franco e secretário Caetano A. Munhoz (seu primo), em que estes
enfatizam a necessidade de se reerguer essa antiga sociedade dramática. Os
signatários pedem o apoio da população para tanto, que deve subscrever lista
que lhe será oportunamente apresentada. A assinatura deve ser pelo menos por
seis meses. A sociedade dará um espetáculo por mês (101). O objetivo assim era assegurar um
público mínimo que permitisse a sobrevivência da sociedade dramática, nessa
Curitiba com poucas opções de lazer, antes do advento do cinema. A propósito, a
primeira sala fixa de exibições cinematográficas no país é de 1897, aberta no
Rio de Janeiro, enquanto o futebol só seria introduzido oficialmente aqui em
1894, por Charles Miller (102). Com relação aos esportes, o que
predominava nessa época eram as corridas de cavalos. Como havia poucas opções
de lazer, as festividades religiosas assumiam então maior importância.
Em 1871 consta no DD
nota de Francisco de Assis Gonçalves que, ao retirar-se da capital, agradece à
Sociedade Dramática Particular de Curitiba pelo fato de ter oferecido em
benefício da esposa dele, a atriz Minelvina Rosa dos Santos Gonçalves, o
espetáculo teatral realizado em 3 de maio de 1871 (cf. anúncio publicado no
jornal) (103). Faz questão de destacar três membros
da Sociedade-- Caetano Alberto Munhoz, Júlio de Oliveira Ribas Franco e Adolpho
Ribas de Oliveira Franco. Os dois últimos eram primos de Caetano Alberto,
filhos do brigadeiro Manoel de Oliveira Franco, irmão de sua mãe Francisca, a
1ª. esposa de CJM. Júlio trabalhava então na secretaria da presidência da
Província do Paraná (104).
Caetano Alberto foi seu padrinho de casamento. O DD o cita como um dos
padrinhos arrolados dos três casamentos conjuntos que se realizaram em 2 de
setembro de 1871, envolvendo duas filhas (Francisca e Thalia) e um filho de Manoel de Oliveira Franco (Júlio).
Os casamentos se realizaram na casa do brigadeiro, em “oratório particular” (105).
Em fevereiro de 1872, o
jornal divulga o resultado da eleição, realizada entre os sócios, para os
cargos da administração da sociedade dramática Phenix. O presidente será Júlio
de Oliveira Ribas Franco, o vice-presidente, João Ferreira Leite, o 1º
secretário, Caetano Alberto Munhoz, o 2º secretário, Constantino Ferreira Belo,
e o tesoureiro, Francisco de Paula Fonseca (106).
Em julho de 1873 o DD publica uma nota, sob o título “Phenix”, em que o
signatário, “C.A.” (Caetano Alberto), convida os sócios que vão participar do
drama “que vai entrar em ensaios” a comparecerem no teatro no dia 17 de julho,
às 7 horas da noite, “a fim de receberem suas partes” (107). Quase um ano mais tarde, no DD de 6 de junho
de 1874- p.4, ainda consta um anúncio de uma apresentação da Sociedade
Dramática Particular Phenix.
Caetano Alberto foi
também 1º secretário de uma outra sociedade, a “Recreio Literário”, “destinada ao
cultivo das letras”, conforme edição do
DD de 6 de fevereiro de 1875, p. 2. O presidente dessa associação é o Dr.
Generoso Marques dos Santos (que já fora deputado provincial e era do Partido
Liberal; fazia poemas e exercia o jornalismo), o vice-presidente é o Pe. Antonio Vicente da Cruz. Os outros
cargos da diretoria são: 2º secretário: Maurílio Moreira de Magalhães Sampaio;
1º orador: Dr. Joaquim Ignácio Silveira da Mota Jr.; 2º orador: Dr. Joaquim de
Almeida Faria Sobrinho; tesoureiro: Constantino Ferreira Belo; bibliotecário:
Francisco Antonio de Souza Castro.
Os objetivos da associação
“Recreio
Literário” eram:
--Contribuir para o
desenvolvimento intelectual de seus membros, proporcionando-lhes um
entretenimento útil e agradável, por meio do estudo dos bons livros.
--Promover
discussões sobre teses científicas e literárias.
--Formar uma
biblioteca de obras nacionais e estrangeiras, para cujo fim a diretoria irá
promovendo a aquisição dos de reconhecida utilidade, havendo para esse fim os
fundos necessários.
--Instituir, quando
as circunstâncias da associação o permitirem, cursos de retórica, história,
geografia e filosofia, e de outros conhecimentos úteis.
O relatório do
presidente Adolpho Lamenha Lins de 15 de fevereiro de 1876, p. 56, além de
transcrever os objetivos da associação citados acima, informa que a sua
biblioteca possuía 485 volumes. Acrescentando os anais do senado de 1861 a 1873
e do parlamento brasileiro de 1864 a 1875, além de relatórios diversos, o
número de volumes se elevava para 851. O presidente se estende sobre a questão
das bibliotecas em seu relatório, revelando a importância que atribui ao tema. Refere-se
inicialmente à Biblioteca Pública, em Curitiba, para a qual pede a atenção da
Assembleia Legislativa. Os “restos antes dispersos” da antiga biblioteca, 834
livros, foram reunidos na casa onde funcionava a Inspetoria da Instrução
Pública. Quanto às bibliotecas ligadas às entidades associativas, além daquela
mantida pela sociedade “Recreio Literário”,
menciona outra em Curitiba, a do “Club Literário Curitibano”, com 584 volumes,
inaugurada em 19 de dezembro de 1874, cujo presidente honorário era o Dr. Agostinho
Ermelino de Leão. Menciona também as do interior da província-- do Club de Leitura Portocimense, Club Literário
de Paranaguá, Club Democrático Antoninense, Club Literário Campo Larguense,
Club Literário Pitanguyense, além das de Castro e Lapa (Associação Literária
Lapeana).
Um ano antes desse
relatório de Lamenha Lins, na data da edição do DD antes referida, a biblioteca
da sociedade “Recreio Literário” contava 335 volumes doados pelas pessoas ali mencionadas.
Caetano Alberto doou 28 volumes, seu irmão Alfredo Caetano, 13, seu primo Júlio
de Oliveira Ribas Franco, 21. O Conselheiro Manoel Francisco Correia
(1831-1905) foi quem mais doou: 72 volumes (108).
Esse irmão do Barão do Serro Azul era, em 1875, deputado da Assembleia Geral
(ou Câmara dos Deputados). Já fora presidente dela, e também da província de
Pernambuco, além de ministro de Estrangeiros no gabinete conservador do
Visconde do Rio Branco em 1871 (109).
Em edição de 7 de julho do mesmo ano, o secretário “Caetano Alberto”, da
sociedade “Recreio Literário”, comunica que haverá sessão no domingo, dia 11 de
julho de 1875, às 6 horas da tarde, para discutir a tese apresentada pelo Dr.
Faria Sobrinho – “O amor da pátria é um sentimento natural ou efeito da
educação?” (110).
A sociedade “Recreio
Literário” é mencionada em duas notas publicadas na “Província do Paraná”, de
Curitiba (que apoiava o Partido Liberal), em outubro de 1876, e assinadas pelo
1º secretário Caetano Alberto. Nelas, ele contesta alguém (cujo nome não é
citado) que deve ter feito algum comentário maldoso por estar em seu poder
“objetos” da sociedade (“Se os conservo, não é porque queira apoderar-me do que é alheio”: só quem
mal usa é que terá cuidado o contrário disto”). Tal acervo ele “prontamente”
entregará “a quem se mostrar com direito, não obstante estar eu, em nome dela,
responsável para com os srs. Leuzinger & Filho por uma dívida de 84$000”.
Fecha uma das notas referindo-se, em termos indiretos e irônicos, ao
maledicente: “Com o belo alazão todos
compreendem que não devo meter-me para evitar algum coice” (111). Esse tipo de nota aparecia com
frequência na imprensa local da época.
No relatório de Lamenha
Lins de 15 de fevereiro de 1877 a sociedade “Recreio Literário” já não é mais
citada, indicando talvez que se desfizera. Com relação a Curitiba, só é
mencionado o Club Literário Curitibano, cuja biblioteca possuía então 702
volumes (p.64). Os “poucos livros” da
Biblioteca Pública achavam-se depositados agora numa das salas do Instituto
Paranaense. O presidente pede a “solicitude” da Assembleia Legislativa em seu
favor (p.63).
Em 1867, o DD informa
sobre a eleição, realizada em 29 de maio, da nova mesa da Irmandade do Senhor Bom Jesus do Perdão, “que se venera na igreja
de Nossa Senhora do Rosário” em Curitiba, relativa ao período 1867-69. Compareceram
à eleição 152 irmãos. O tenente Caetano Alberto é eleito um dos 12 mesários
(com 74 votos), enquanto Fidêncio Antônio Munhoz é eleito “procurador” (com 77
votos) (112). A Fidêncio, porteiro da Tesouraria
Provincial, dedico o capítulo 8 deste trabalho. Se havia alguma relação de
parentesco dele com CJM ou seus filhos, não consegui apurar. F. Negrão não o
cita na “Genealogia Paranaense”. Como
se viu antes, CJM foi um dos “irmãos instituidores” dessa irmandade, que foi constituída
mais recentemente. Teve o seu Compromisso aprovado em 1864.
Caetano Alberto também
participava da antiga Irmandade do SS.
Sacramento, da Igreja Matriz. Em 1868 ele é eleito um dos 12 mesários dessa
irmandade, “que tem de funcionar no ano de 1869” . Outro mesário eleito é
Emílio Nunes Corrêa de Menezes, pai do famoso poeta curitibano de mesmo nome. Um
dos 8 “provedores” escolhidos é o Dr. José Cândido da Silva Murici (113). Mais tarde, em 1873, o DD afirma que
Caetano Alberto foi eleito novamente um dos 12 mesários para a administração da
mesma irmandade, juntamente com 8 provedores (dentre os quais os ervateiros Vicente
Ferreira da Luz e Luiz Manoel Agner), tesoureiro, procurador e escrivão. Eles
devem servir no “ano compromissal” de 1873-1874 (114).
Caetano Alberto segue
assim a tradição da família e os costumes da época. Como se viu antes, e se
verá ainda, também seu avô Florêncio José Munhoz, seu pai CJM e seus irmãos
Alfredo e Florêncio (neto), participaram de irmandades religiosas. Como a religião
oficial do Império era a católica, as pessoas podiam associar-se a essas
irmandades mais por uma imposição social do que por convicção religiosa, o que,
todavia, não exclui este último caso.
Caetano Alberto também
frequentava a Maçonaria. Em uma edição do DD de 1876 (115), ele é mencionado como um dos que “produziram
poesias e discursos” na festa maçônica realizada em 24 de junho, promovida
pelos “obreiros da loja Apóstolo da
Caridade”. Dias depois, o jornal informa (116) que essa mesma loja maçônica mandou celebrar missa pela
alma da finada esposa do conselheiro Saldanha Marinho. Essa referência nos
induz a associar tal loja à corrente maçônica liderada por este republicano
histórico (1816-1895). Nessa época, segundo o “Dicionário do Brasil Imperial”,
havia uma disputa entre o Grande Oriente,
dirigido pelo Visconde do Rio Branco, e o Grande
Oriente do Brasil, presidido por Saldanha Marinho, disputa essa que se estendeu de 1863 a 1883. Enquanto a primeira organização enfatizava
mais o caráter filantrópico da Maçonaria, a segunda, sob influência francesa,
salientava a sua atuação política (117).
No ano seguinte, 1877,
conforme já mencionei, Caetano Alberto e Alfredo participarão de outra festa
maçônica, esta realizada na loja “Concórdia
4”, localizada no Alto de S. Francisco.
Em 1879, segundo a
“Província do Paraná” de 30 de agosto, p. 4, o requerimento de Caetano Alberto Munhoz e de outros
cidadãos recebeu parecer favorável da “comissão de terrenos do quadro urbano”
da Câmara Municipal de Curitiba. Com
relação a outras pessoas, a edição de 6 de setembro, p. 4, do mesmo jornal
informa que a comissão é pelo indeferimento, pois “a Câmara resolveu que não se
concedesse mais terreno aos requerentes, visto já possuírem em grande
quantidade que não está ainda edificado”. Este era assim o benefício público esperado
de tais concessões.
Quanto à vida profissional (no tempo do
Império) de Caetano Alberto, o DD também faz algumas referências a ele. Mostra que
foi admitido como “colaborador” da
secretaria da presidência em 1866, aos 19 anos, pois consta no “Expediente da Presidência” de 7 de abril despacho autorizando
tal colaboração, mediante a gratificação de 50$000 mensais (118). O presidente da Província em
exercício era então Agostinho Ermelino de Leão, que governou de 23 de março a
15 de novembro de 1866 desta vez (119).
Trata-se de alguém radicado na comunidade local, e certamente sensível à
influência de CJM. Ainda em 1866, o jornal informa que Caetano Alberto foi
nomeado para o posto de tenente-cirurgião do 1º corpo de cavalaria da Guarda
Nacional (120), comandado pelo pai (no futuro Caetano
Alberto se tornará coronel, conforme tratamento que lhe é dado por F. Negrão). Em
28 de fevereiro de 1867 ele é nomeado “amanuense” da secretaria do governo provincial.
O presidente era então Polidoro César Burlamaque (121). Em 1870 o jornal informa que ele é um
dos quatro candidatos que se submeterão aos exames para os lugares vagos de “2º
escriturário”, “amanuense” e “praticante” da Tesouraria de Fazenda (ele tem então 23 anos). A edição
do DD de 13 de julho afirma que todos os candidatos foram aprovados. Os exames
abrangeram Gramática Portuguesa, Ortografia, Aritmética, Francês, História e
Geografia do Brasil, Álgebra e Escrituração Mercantil (122). Ele ocupou vaga de “2º escriturário”. Em 1873 é nomeado “1º
escriturário” da Tesouraria de Fazenda (123).
E em 1876 sua renda, como empregado público, é de 1:600$000 (124).
No “Expediente da
presidência” da província, publicado no DD de 11 de julho de 1880- p. 2, consta
despacho à Tesouraria geral informando que foi colocada
à disposição desta
presidência a quantia de 200$ para ser entregue a Caetano Alberto Munhós, em
retribuição dos serviços que prestou, como oficial de gabinete, ao ministro da
agricultura, durante o tempo que este se achou nesta província
O ministro da
Agricultura, Comércio e Obras Públicas, Manoel Buarque de Macedo, integrou a
comitiva do imperador D. Pedro II em sua visita ao Paraná em maio de 1880 (125). Logo, foi para ele que Caetano Alberto
prestou serviços enquanto aqui esteve, acompanhando o Imperador.
Em 1881, o 1º
escriturário Caetano Alberto Munhoz é nomeado inspetor da Tesouraria de Fazenda
da província de Mato Grosso (126), transferindo-se então para Cuiabá. Mas a estadia aí não lhe
foi feliz, como se verá adiante. Sucedeu
seu irmão Alfredo, que ali esteve, ocupando o mesmo cargo, durante 1878-79.
Em 22 de março de 1881,
Caetano Alberto e Alfredo apresentaram “requerimentos para serem alistados
eleitores” (127), os quais são deferidos. O edital do
juiz de direito da comarca da capital, Agostinho Ermelino de Leão, publicado no
jornal no final de junho (128), inclui os seus nomes no
alistamento dos cidadãos da paróquia de
Curitiba. Tratava-se do primeiro alistamento eleitoral realizado na província,
determinado pelo presidente João José Pedrosa (cf seu relatório de 16 de
fevereiro de 1881, p. 13), em decorrência da chamada “Lei Saraiva” (decreto nº 3.029, de 9 de janeiro de
1881), que reformou a legislação eleitoral, acabando com as eleições indiretas
para senadores e deputados, tanto à assembleia geral quanto às provinciais.
O DD de 25 de outubro
de 1882, p.3, informa a chegada a Curitiba de Caetano Alberto Munhoz, “digno
inspetor da tesouraria de fazenda de Mato Grosso”. Alguns dias depois, o jornal
(129) noticia o falecimento da esposa dele,
D. Leonídia da Silva Pereira Munhoz, com apenas 26 anos, que deixa quatro
filhos. Caetano Alberto veio à terra natal para tratamento da saúde dela. Mas
os recursos empregados “para debelar o mal e salvá-la” foram ineficazes. A nota
conclui afirmando que seus “graves sofrimentos” começaram em Mato Grosso , para onde
Caetano Alberto havia sido transferido. Pelo convite para missa de 7º dia,
publicado no DD (130), depreende-se que a irmã de Leonídia
era casada com Joaquim de Almeida Faria Sobrinho (1847-1893), futuro presidente
da província, filiado ao Partido Conservador. O presidente Faria era assim seu
concunhado (a propósito, Faria foi procurador da viúva de CJM, e de outros
herdeiros, no inventário de CJM em 1878).
Na sequência, Caetano
Alberto é transferido para Santos, nomeado 1º escriturário da sua Alfândega e,
alguns meses depois, Chefe de Seção da mesma entidade (131). Em 25 de abril de 1885, contrai 2as. núpcias
com D. Maria da Conceição Lustosa, sua prima, filha do tenente-coronel Antônio
Ricardo Lustosa de Andrade (1823-1884), casado com uma irmã de D. Francisca, a
mãe de Caetano Alberto. Esse seu tio ocupou vários cargos públicos e foi
deputado provincial nos biênios 1868-69 e 1880-81 (132). Ainda em 1885, o jornal informa sobre
o lançamento de obras suas, vinculadas às atividades profissionais. Assim, em
outubro consta este anúncio:
Obra útil- “Apontamentos sobre livros, contratos comerciais, contas correntes (selos e outras formalidades)” por Caetano A. Munhoz, chefe de seção da alfândega de Santos. Acha-se à venda na Livraria Contemporânea à rua da Imperatriz (133).
O jornal, no mês
anterior, já havia se referido a esse trabalho, que lhe fora ofertado pelo
autor:
É um excelente
pecúlio de esclarecimentos abreviados e seguros para os comerciantes em relação
aos livros que devem ter, modo de escriturá-los e legalizá-los, e não menos
digno de apreço para os que se dedicam à profissão do foro. Parabéns ao seu
distinto autor (134).
A Livraria Contemporânea, que funcionava na rua da Imperatriz nº 36 (atual XV de Novembro), vendia também óculos
e pince-nez, cordas para rabeca e
violão, palhetas para clarineta e requinta, mamadeiras e bicos...(135). Outro anúncio publicado no jornal (136) informa que a Livraria Contemporânea
vendia ainda “termômetros Celsius para médicos”
(também a Livraria Popular, na
rua do Dr. Westphalen, além de livros, inclusive “franceses, ingleses e
alemães”, vendia artigos de escritório) (137). Revela-se aí a precariedade dessas livrarias, e também a do meio, pois a
diversificação de atividades dos estabelecimentos indica o fraco mercado para
livros.
Uma edição do DD em
1886 (138) traz nota sobre o folheto
“Apontamentos sobre as atribuições e expediente das inspetorias comerciais”.
Nele, diz a matéria, o autor compilou diversas disposições referentes às
inspetorias comerciais, criadas pelo decreto nº 6.384, de 30 de novembro de
1876. Segundo o jornal, “É um trabalho excelente e que deverá ser utilíssimo às
repartições de fazenda e ao comércio em geral. Agradecemos
o exemplar que nos foi enviado”. Note-se que Caetano Alberto, apesar de suas
vinculações ao Partido Conservador, não se impede por isso de encaminhar uma
cópia do trabalho ao DD, órgão do Partido Liberal desde 5 de setembro de 1885.
No ano seguinte, 1887,
em uma edição do DD (139)
consta nota sobre outro
trabalho de Caetano Alberto, “digno chefe de seção da alfândega de Santos”,
intitulado “Canhenho dos conferentes e despachantes das alfândegas e mesas de
rendas”, com 255 páginas, publicado em S.Paulo.
E em abril de 1888 (140), o jornal informa que ele foi nomeado inspetor da alfândega de Uruguaiana,
no Rio Grande do Sul. Mas segundo a
parte histórica do site da Receita Federal Caetano Alberto exerceu tal função
em 1887 e 1888 (141).
*
Luíza
Cândida Munhoz faleceu solteira, segundo F. Negrão. Foi
batizada em 12 de março de 1849, “com dois meses e meio de idade” (142). Faleceu em 1886, como se depreende da
seguinte nota, contida no DD de 11 de março de 1886- p.2:
Vítima de febre
amarela, que infelizmente está tomando grande desenvolvimento na corte, faleceu
a exma. sra. d. Luíza Munhoz, irmã do sr. Alfredo Munhoz, cuja senhora se
achava ali de passeio, em companhia de seus parentes. Tão prematuro quanto
inesperado golpe muito deve ter contristado o coração de sua extremosa família,
à qual enviamos a expressão do nosso pesar.
Tinha
então 37 anos, apenas. Seu nome completo
era Luíza Cândida Munhoz, conforme consta no convite para a missa pela sua alma
mandada celebrar por “Alfredo Caetano Munhoz, seus irmãos e cunhados” na mesma
igreja matriz de Curitiba onde fora batizada (143). Em outra edição do DD (144) os irmãos Alfredo, João Alberto e
Florêncio Munhoz, além do cunhado Manoel Negrão, agradecem ao Dr. Caetano de
Faria e Albuquerque e seus familiares pelo tratamento que lhe deram, pois “um
só minuto não deixaram de cercar o leito da enferma com o carinho e desvelo
próprios de almas elevadas”. Afirmam ainda na nota que Luíza “em seus últimos
momentos só lamentava a ausência dos íntimos parentes”.
Em
1859, “Luizinha” é citada numa carta de D. Francisca a seu filho Alfredo, que
então estudava em Petrópolis, transcrita anteriormente. Ela, aos 10 anos, frequentava
escola de uma senhora bahiana, “bem boa mestra”, segundo a mãe.
*
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Augusta Munhoz e Manoel de Souza Dias Negrão (Fonte: "Memorial de Família" por Eremir Bley Corrêa. Curitiba, 1995- p. 182) |
Augusta
Cândida Munhoz nasceu em 13 de março
de 1851 e faleceu em 22 de junho de 1920 (145). Casou-se com o major Manoel de Souza Dias Negrão (1848-1895), que viria a ser
secretário interino do governo provincial em 1877 e deputado da Assembleia
Legislativa do Paraná, no biênio 1878-79, da qual foi 1º secretário. Pertencia
ao Partido Conservador. Em 1880, era vereador de Curitiba. Também secretariou o
Club Literário Curitibano (146).
Conforme
informações de diversos relatórios de governo, iniciou sua vida profissional
como “arquivista” da secretaria da presidência. Depois foi nomeado “praticante”
da Tesouraria Provincial pelo vice-presidente Manoel Alves de Araújo, conforme
seu relatório de 1865, e “amanuense” da mesma Tesouraria pelo presidente
Antonio Augusto da Fonseca em 1868, onde permaneceu até 18 de julho de 1870. Em seguida, foi administrador da barreira de
Curral-Falso e, com a extinção desta, nomeado para uma das barreiras da estrada
da Graciosa, responsável aí pela arrecadação das taxas governamentais.
Continuou portanto vinculado à Tesouraria Provincial, que abrangia então 9
coletorias, 4 registros, 6 barreiras, 1 agência e 2 estações fiscalizadoras. Em
1875, foi nomeado escrivão da barreira do Bacacheri e no princípio de 1876, oficial
da secretaria da presidência (ou do governo provincial) pelo presidente Lamenha
Lins, conforme seu relatório desse ano. Esse mesmo presidente afirma, em seu
relatório do ano seguinte, que o promoveu a major comandante do 1º batalhão de
artilharia da Guarda Nacional da Capital em 4 de março de 1876. Afirma também
que o nomeou, em novembro deste ano, chefe
da 1ª seção da secretaria do governo, sendo secretário o Dr. Justiniano de
Mello e Silva. O jornal deste, “O Paranaense”, fazia constar no cabeçalho--
“Orgão do Partido Conservador”, mas adotava uma postura crítica inclusive com
relação a membros de seu partido. O jornal de Justiniano abriu espaço a Manoel quando
este se tornou deputado provincial (v. edições de “O Paranaense” em 1877-78) (147).
Manoel, chefe da 1ª
seção, substituiu Justiniano de Mello e Silva, a partir de 17 de setembro de
1877, quando este se licenciou e em seguida deixou a secretaria do governo
provincial (cf
relatório do presidente Joaquim Bento de Oliveira Júnior de 7 de fevereiro de
1878, p.78).
Deve ter permanecido no
cargo por quase cinco meses (após a gestão de Lamenha Lins, no período do
vice-presidente Manoel Antônio Guimarães e do presidente Joaquim Bento de Oliveira
Jr), até pelo menos 16 de fevereiro de 1878, data da Carta Imperial que nomeou
o novo secretário da província, segundo relatório do presidente Rodrigo
Octavio de Oliveira Menezes de 9 de abril desse ano, p. 8.
Em 1879, o deputado
Manoel Negrão apresentou um projeto de lei na Assembleia Provincial “que altera
artigos de posturas da câmara da capital”, em benefício dos comerciários da
época. O projeto proibia que os seus estabelecimentos abrissem as portas nos
domingos, das 3 horas da tarde em diante. No ano anterior, Manoel Negrão já
havia apresentado projeto semelhante, que não foi sancionado pelo presidente
Rodrigo Octavio. Ele agora excluiu os dias santificados. Mas seu projeto só
conseguiu ser aprovado pela Assembleia após sofrer nova alteração, restringindo
o fechamento dos estabelecimentos comerciais nos domingos apenas das 3 horas da
tarde até às 7 da noite. De qualquer forma, a “classe caixeiral” comemorou sua
sanção pelo presidente Dantas Filho, saindo às ruas de Curitiba com banda de
música e queimando fogos (cf edições de “O Paranaense” de julho e agosto de
1879: em julho, dias 10 e 17- p. 4, e em agosto, dias 10, 17 e 26- p. 2, 3 e 2,
respectivamente).
Registre-se ainda que
Manoel de Souza Dias Negrão foi um dos proponentes no processo de arrematação
da renda das barreiras da estrada da Graciosa, promovido pelo governo
provincial, relativamente à arrecadação das taxas aí cobradas. Mas sua
proposta, que oferecia 136:300$000 ao governo, não foi a vencedora dessa
arrematação. Assim, outro proponente se encarregaria do serviço de arrecadá-las.
De qualquer forma, o valor da proposta de Negrão indica a elevada capacidade
financeira de que dispunha (cf. relatório do presidente Carlos de
Carvalho de 1º de outubro de 1882, p.27-28).
Mais tarde, seu nome
também aparece como um dos que apresentaram proposta na concorrência aberta
pelo governo provincial para o serviço de conservação da estrada da Graciosa.
Mas o presidente Faria Sobrinho escolheu a proposta de Lino de Souza Ferreira
mais vantajosa aos interesses da
Província, conforme consta em seu relatório de 17 de fevereiro de 1887, p. 33.
Com o advento da
República, o governador do Estado (não mais Província) José Marques Guimarães,
reduziu para duas as três seções da Secretaria do Governo, pelo decreto nº 6,
de 23 de dezembro de 1889. Em consequência, dispensou Manoel do lugar de chefe
da 2ª seção da Secretaria do Governo, transferindo para esta o titular da 3ª
seção. Logo depois, pelo decreto nº 30, ele seria aposentado como chefe da 2ª
seção. A propósito, o poeta Emiliano Perneta, recém-formado pela faculdade de
Direito de S.Paulo (que nas férias fazia aqui campanha abolicionista e republicana),
foi nomeado nessa oportunidade oficial de gabinete daquela Secretaria. Emiliano
também integraria, juntamente com outros cinco membros, uma comissão criada
pelo governador para “organizar um plano
imediatamente exequível e relativo à instrução pública, primária e secundária,
deste Estado”, objetivo cumprido pela referida comissão (cf
relatório do contra-almirante José Marques Guimarães de 18 de fevereiro de
1890, p. 4, 5 e 11).
Segundo
Francisco Negrão, seu tio Manoel de Souza Dias Negrão foi um dos onze filhos do
Cap. João Negrão, o velho, português que desembarcou em Paranaguá em 1814 “e
foi negociante e exportador de madeiras e betas” (148), tendo ali se casado. “Foi um dos
primeiros beneficiadores de erva-mate no Estado, cujo serviço era feito em
pilões, por braço escravo”. Depois de residir em Morretes, “onde continuou com
o mesmo ramo de negócio”, transferiu-se em 1834 ou 1835 para Curitiba,
estabelecendo-se “com negócio de fazendas, armarinhos, secos e molhados,
fazendo construir um engenho de beneficiar erva-mate movido a força hidráulica”.
Manoel era irmão de João, Ricardo e Antônio, citados adiante. João Negrão,
capitão como seu pai homônimo, ocupou cargos no governo e foi deputado à
Assembleia Provincial. Pertencia ao Partido Conservador. Faleceu em 1887. Deu nome
a uma das ruas centrais de Curitiba, antes rua do Rio Paraná. Era pai de Francisco
Negrão (1871-1937). Faleceu quando o historiador era ainda muito jovem. Por
isso, colheu sobre ele diversos depoimentos, que incluiu na “Genealogia”, um
dos quais de Alfredo Munhoz:
Só tenho motivos para
aureolar a memória do ilustre e proeminente membro da distinta família Negrão.
Como político, vi-o sempre nas mesmas fileiras a que eu pertencia, sob a
honrada chefia do inesquecível e grande homem Dr. Manoel Euphrasio Correia.
Sempre constante e leal ao seu partido. Exemplaríssimo chefe de
família...Coração aberto aos mais nobres sentimentos, foi modelo de Amigo (149).
En passant,
gostaria de salientar que se explicita aqui, nesse depoimento de 1914, a opção
política de Alfredo, que por dever de ofício serviu tanto a governos liberais
quanto conservadores. Todavia, na edição de 26 de setembro de 1885, p.4, “O
Futuro” transcreve discurso do mesmo Manoel Euphrasio na Câmara dos Deputados,
em debate com o outro deputado pela província do Paraná, o liberal Manoel Alves
de Araújo, que havia acusado a Tesouraria de Fazenda de ser “o centro da cabala
do partido conservador na última eleição” (i.e, a de deputado geral). Manoel
Euphrasio não contesta a opção conservadora de Alfredo mas apresenta como
argumento contra Alves de Araújo a carta que o presidente liberal Brasílio
Machado envia a ele, ao deixar o governo em 20 de agosto de 1885, agradecendo
“sua lealdade e zelo com que coadjuvou-me no desempenho do referido cargo” (mas
o mesmo presidente havia perseguido politicamente Florêncio -- irmão de Alfredo
e funcionário da Tesouraria -- por não apoiar o seu candidato à Câmara dos
Deputados...). Fica clara também aqui a admiração de Alfredo por Manoel
Euphrasio Correia (1839-1888), para mim muito questionável, adotando-se os
critérios progressistas de sua época.
Os
outros irmãos do marido de Augusta, major Ricardo de Souza Dias Negrão (1835-1921)
e major Antonio Ricardo de Souza Dias Negrão (1846-1912), eram também militantes
do Partido Conservador. Enquanto o primeiro dirigiu o jornal “O Democrata” e
fez parte da redação de “O Pionier”, juntamente com Tertuliano Teixeira de
Freitas (pertencendo a uma corrente divergente do Partido, após a morte de Manoel
Euphrasio), o segundo foi deputado provincial e exerceu vários cargos públicos (150).
No
livro “Revivendo fatos da infância e da adolescência”, de Lilia Albuquerque
Vellozo, bisneta de CJM e neta de Augusta Munhoz Negrão, é possível entrever
uma cena da vida doméstica da sociedade escravocrata curitibana (a época deve
ser o final da década de 1850, se considerarmos o ano de nascimento de Augusta).
Primogênita (sic) de Caetano Munhoz, por
quem ele tinha predileção, (Augusta) foi criada no seio de família numerosa,
com muito luxo e regalias de uma pessoa rodeada de escravos.
Seu pai era proprietário de um engenho de
erva-mate, o primeiro engenho a vapor de Curitiba, localizado no alto da
Glória, onde tudo ali lhe pertencia, inclusive uma Capela que mandou construir.
Minha avó recebeu educação esmerada, lia e escrevia muito bem e tocava piano.
Com o falecimento de sua mãe, seu pai (CJM)
contraiu novas núpcias, com uma sobrinha, advindo desse matrimônio outros
filhos. /.../
Meu bisavô era severo no que dizia respeito
à educação dos filhos; uma das coisas que não permitia era que as filhas
entrassem na cozinha.
Certa vez, minha avó
fez uma travessura; a pretexto de ir buscar um pouco d’água, entrou na cozinha, sem que os familiares notassem.
Assustada, ao vê-la, a escrava derrubou uma gamela de louças que carregava. Em
prantos, entrevendo o castigo que a esperava, pediu ajuda a minha avó. Esta
tranquilizou-a, dizendo que intercederia em seu favor; e foi o que fez mais
tarde. Assumiu a culpa, dando outra versão ao caso, ao mesmo tempo que pedia
escusas, pela desobediência.
Sempre
bondoso para com ela, seu pai repreendeu-a brandamente pela falta e disse
rindo:
-- Quanto à louça,
minha filha, não se amofine, se não fosse assim, os comerciantes não
enriqueciam...
Minha avó casou-se com Manuel de Souza Dias
Negrão /.../
Meu bisavô não fazia muito gosto com esse
casamento /.../ Finalmente, acabou
cedendo e deu uma grande festa, no dia do enlace, em duas casas de sua
propriedade, nas esquinas da atual Rua Marechal Deodoro, com vistas para a
Praça Zacarias. Numa dessas casas foi feito um almoço para os pobres, e na
outra, para as pessoas das relações sociais de meu bisavô.
/.../
A fortuna de meu bisavô evaporou-se com a
sua morte repentina. Minha avó, que deveria herdar tanta coisa, nada recebeu, a
não ser uma pequena quantia em dinheiro, que seu esposo doou para a Santa Casa
de Misericórdia (151).
O casamento de Augusta, que contava então 19
anos de idade, ocorreu em 19 de fevereiro de 1870, conforme esta notícia
estampada no “Dezenove de Dezembro”:
CASAMENTO- Sábado, 19
do corrente, casou-se o Sr. Manoel de Souza Dias Negrão com a Exma.Sra.
D.Augusta Cândida Munhós.
O Sr. tenente coronel
Caetano José Munhós, pai da noiva, em sinal de regozijo por este consórcio deu
na mesma noite um baile em nada inferior aos que ultimamente foram oferecidos
ao Exmo. Sr. Dr. Dias da Rocha (a) pelos seus amigos, e à assembléia provincial
pelo Exmo. Sr. presidente da província. (b)
A
delicada hospitalidade da Exma. família do Sr. tenente coronel Munhós sobremodo
penhorou ao inexcedível concurso de convidados que concorreram a tão
prazenteiro sarau” (152).
-----------------------------
(a)
Era então presidente da Assembleia Legislativa.
(b) No DD de 19 de fevereiro de 1870- p. 3 consta nota
sobre o baile oferecido pelo presidente da Província Dr. Antônio Luis Afonso de
Carvalho aos membros da Assembleia Legislativa provincial. Nesse baile, que
durou até perto das 4 horas da manhã, o “serviço de chá e dos refrescos foi
ótimo”. A nota conclui assim: “Remontando às eras mais remotas não há memória
de uma festa semelhante no Paraná” (sobre esse baile, v. também o Folhetim do
DD de 26 de fevereiro de 1870- p.1).
Manoel de Souza Dias Negrão deixou este
registro a propósito do seu casamento, de cuja festa participou a “população de
mais consideração da capital”:
Casei-me no dia 19 de fevereiro de 1870 com
Augusta Cândida Munhoz Negrão, filha legítima do tenente coronel Caetano José
Munhoz e D. Francisca de Assis Franco Munhoz. O ato que realizou-se em oratório
particular, à rua do Comércio desta cidade, hoje do Imperador, pertencente ao
meu sogro e na contígua de propriedade do Sr. Manoel Gonçalves dos Santos (153),
foi esplêndido. Todas as autoridades civis e militares, a sociedade completa de
Curitiba se achavam presentes. Achavam-se também presentes o Presidente da
Província Antonio Luiz Affonso de Carvalho, entre outros dos mais distintos
cidadãos, importantes e amigos; secretário de governo Pamplona de Menezes, Dr.
Agostinho de Leão, Dr. Dias da Rocha, Muricy, Assembleia Provincial em sua
maioria, tenente coronel Antonio Ricardo Lustoza, Eugenio Luz; meus irmãos
João, Ricardo e Antonio; minha mãe, minhas irmãs Belisa, Guilhermina e Maria;
Capitão Tibúrcio de Macedo, Antonio Franco, Bento de Menezes, Antonio Nóbrega,
Silveira de Miranda, Antonio de Paula, João Carvalho de Oliveira, família
Gonçalves, filhos do Sr. Francisco José Gonçalves, Pedro de Queiros, Nicolao
Lopes, Dr. Barros, Candido Lopes, Comendador Ricardo dos Santos, Dr. Generoso
Marques, Tte. Cel Benedicto Eneas de Paula, Juca Bittencourt, Manoel
Bittencourt, Damaso Bittencourt, Julio Franco, Adolpho Franco, Sesinando Ribas,
João Baptista Ribeiro, famílias de todos estes; Joaquim Lourenço de Sá Ribas,
Augusto Stelfelld, Vicente Luz, diretor da estrada de D.Francisca, Dr. Horacio
e outros mais que não posso no momento lembrar-me. Suponho que a população de
mais consideração da capital toda se achava presente, porquanto o vasto salão do
então hotel - Polônio – e toda espaçosa casa em que efetuou-se o casamento se
achavam tomados de convidados. O serviço de mesa e o aparato; a regularidade, a
ordem, a abundância da diversidade de doces, licores, cerveja e outras bebidas,
o menu não podiam ser mais completos.
A
imprensa deu notícia a mais lisonjeira... (154)
Analisando a relação das pessoas presentes na
cerimônia, observo que, apesar da vinculação do noivo ao Partido Conservador,
seus amigos tanto pertenciam a esse partido como ao Liberal (era o caso de
Generoso Marques, Benedicto Enéas de
Paula, Dr. Murici e outros).
Alfredo Munhoz, em comentário a essas linhas
escritas pelo cunhado, afirma que o que
mais o impressionou nessa “festa esplêndida” foi “uma quadrilha ou contra-dança,
composta pelo hábil maestro Capitão Bento de Menezes”. Segundo F. Negrão, esse “conhecido
e talentoso musicista” era parente de João Manoel da Cunha, também músico (e
professor de latim e francês), pai do compositor Brasílio Itiberê (155). David Carneiro
afirma que Bento de Menezes (1830-1902) deixou “inúmeras composições,
especialmente missas de Réquiem” (156).
*
João Alberto Munhoz, nascido em 10 de
dezembro de 1852 (157),
“ocupou
por largos anos as funções de Diretor do Interior, Justiça e Instrução Pública
no governo do Estado” segundo Alcides Munhoz (158). Casou-se com Maria Eulália Moreira.
Um de seus filhos foi Carmen Munhoz, que casou com Joaquim Góes de Mello. São
os pais do desembargador José Munhoz de Mello (1912-...), presidente do
Tribunal de Justiça de 1953 a
1958. Outra filha, Valdívia, casou com José Antonio Gonçalves, que, por sua
vez, são os pais do desembargador Jayme Munhoz Gonçalves (1913-...) (159).
Conforme
DD de 2 de dezembro de 1868, p.2, João Alberto, que tinha então 16 anos, é um dos 8 alunos aprovados nos
exames finais na
escola da 2ª. cadeira da capital sob a presidência do sr. inspetor geral Dr.
Ernesto Francisco de Lima Santos, sendo examinadores o respectivo sr. professor
Antonio Ferreira da Costa e o sr. professor do liceu João Manuel da Cunha
(na
matéria consta o texto do discurso do inspetor geral proferido na ocasião, com
muitas citações bíblicas). Dentre os alunos aprovados são citados também Jesuíno Martins Lopes e Nivaldo
Teixeira da Silva Braga (1852-1924). No futuro, este fundaria o Colégio
Curitibano e a “Revista do Paraná”, “o primeiro jornal ilustrado do Paraná”.
Também se casaria com uma prima de João Alberto, filha de seu tio tenente-coronel
Paulino de Oliveira Franco, irmão de D. Francisca (160).
Quase
dois anos mais tarde, no final de 1870, o jornal (161) informa que João Alberto foi um dos “aprovados
plenamente” em francês nos exames dos alunos do colégio de Jacob Mueller, de
Curitiba, realizados de 14 a
17 de novembro. Outros alunos aprovados do colégio: Moisés Marcondes de
Oliveira e Sá, Jesuíno Martins Lopes, Nivaldo Teixeira Braga, Alberto José
Gonçalves (que depois iria estudar no Seminário Episcopal de São Paulo) e
Cândido Ferreira de Abreu.
O
nome de João Alberto integra a relação dos cidadãos da paróquia de Curitiba em condições para o
serviço do Exército e da Armada, publicada no DD de 25 de setembro de 1875- p. 3. Mas
após o seu nome, consta: “Está isento por ser administrador dos
engenhos do seu pai”.
Em
fins de dezembro de 1877, nota no DD afirma que João Alberto partiu para Ponta
Grossa, a fim de trabalhar na comissão a cargo do engenheiro Victor Barreto
Nabuco de Araújo. Essa comissão estava encarregada de diversas providências
destinadas a possibilitar o assentamento de imigrantes russos (russos-alemães,
como se dirá nos próximos relatórios de governo) nos Campos Gerais, alojando-os
naquela cidade “enquanto se fazia a aquisição, medição e distribuição das
terras”, conforme consta no relatório do presidente da província Joaquim Bento
de Oliveira Júnior de 7 de fevereiro de 1878, p. 53. A nota do jornal (162) afirma também
que João Alberto “há pouco voltara do Rio da Prata”. E conclui elogiando as
qualidades desse “moço distinto”. Deduzo que para lá viajara a fim de tratar de
assuntos pendentes relacionados aos negócios de seu pai, falecido em julho de
1877.
Em
1880, foi inaugurado o hospital da Santa Casa de Misericórdia de Curitiba. A
cerimônia de inauguração contou com a presença do imperador D. Pedro II e sua
comitiva. Dentre as pessoas da comunidade paranaense que lá estavam presentes, e
assinaram a Ata relativa ao evento, incluíam-se João Alberto Munhoz e seu primo
Bento Munhoz da Rocha (cf. o livro de Francisco
Negrão-- “Memória da Santa Casa de Misericórdia de Curitiba”, Curitiba, 1932,
p. 21)
F.
Negrão, na “Genealogia Paranaense”, chama João Alberto de “tenente-coronel” (da
Guarda Nacional). Mas aos 29 anos, conforme o DD de 20 de setembro de 1882- p.1, ele é nomeado tenente
da Guarda Nacional (da 5ª. Companhia, do 1º Corpo de Cavalaria). Essa elevação da patente
militar, que deve ter ocorrido por etapas, correspondeu à sua ascensão
profissional, nos anos futuros.
Edital do juiz de
direito Agostinho Ermelino de Leão, da comarca da capital, publicado no DD em
janeiro de 1883 (163), menciona João Alberto dentre os
cidadãos que requereram para serem alistados eleitores da comarca. No final do mês seguinte, verifico pelo
jornal que ele é um dos cidadãos “que foram qualificados eleitores” da paróquia
da capital, conforme edital do juiz municipal da cidade de Curitiba e seu termo
(164).
Quanto ao início de sua
vida profissional, no “Expediente da presidência” da província de 22 de
fevereiro de 1881, publicado no DD (165)
consta despacho dirigido ao diretor geral da instrução pública, autorizando-o a
contratar João Alberto Munhoz, mediante a gratificação anual de 800$, como
professor da cadeira de instrução primária do bairro de Ipiranga, o qual devia,
entretanto, “prestar nesta capital o preciso exame” (166). No ano seguinte, ele é transferido
para a “cadeira promíscua” da Borda do Campo (167).
Mas não exerce muito
tempo essas funções de professor pois ainda em 1882 seu contrato é rescindido,
e ele é nomeado oficial da secretaria da
Assembleia Provincial, cargo que exerce também por um curto período, de 13 de
outubro de 1882 a
20 de janeiro de 1883. Segundo o DD dessa última data, p. 3, ele foi nomeado
“oficial da administração do correio desta província” (168). Nessa condição ele assina vários avisos do Correio Geral do
Paraná publicados no DD, de agosto de 1884 a maio de 1885 (169). O DD de 10 de junho de 1886- p. 1
comunica que ele foi exonerado, a pedido, desse cargo. O Correio subordinava-se
então ao Ministério da Agricultura, Comércio e Obras Públicas. Por isso, João
Alberto foi exonerado por portaria desse Ministério, de 2 de junho, conforme
consta do relatório do presidente Joaquim de Almeida Faria Sobrinho de 30 de
outubro de 1886, p. 51. Outra edição do “Dezenove de Dezembro”
informa que em 28 de julho desse ano ele entrou em exercício do cargo de
administrador do registro do Chapecó, para o qual fora nomeado antes (170) (essa região da província do Paraná
situava-se no território contestado, que pelo Acordo de 1916 passou para Santa
Catarina). No DD de 14 de março de 1887- p. 2 consta que João Alberto entrou
com requerimento na Assembleia Provincial “pedindo que se restabeleçam os
vencimentos de administrador da barreira do Chapecó, que percebia
anteriormente”. O despacho, conforme o “Expediente da assembleia”, encaminha o
requerimento à Comissão de Fazenda.
Até 1889 João Alberto exerceu
as funções de subdelegado do Passo do Assungui, pois o DD de 26 de junho desse
ano, p.1, noticia as diversas exonerações de autoridades policiais que então
ocorreram (em decorrência da assunção do gabinete liberal de 7 de junho), inclusive a
dele, cuja exoneração foi “a pedido”.
O
nome de João Alberto constou da relação de jurados de Curitiba no período de
1884 a 1889 (171).
Em 1888, o DD de 2 de
maio, p.3, publicou nota de agradecimento dele ao médico Dr. Trajano Reis que
tratou “desinteressadamente” de sua filha Valdívia, “já restabelecida de grave
enfermidade”.
No
começo da República a freguesia de N Sra da Conceição do Cercado é elevada à
categoria de vila, com a denominação de vila de Tamandaré, contando com uma
“comissão municipal” presidida por João Alberto Munhoz e integrada por mais 5
membros (cf. DD de 11 de janeiro de 1890- p. 2). Trata-se do atual município de Almirante
Tamandaré, cuja denominação mais antiga era Pacotuba (172). Por outro
lado, as “comissões municipais”, que substituíram as câmaras muncipais, seriam
chamadas depois de “intendências municipais” (cf relatório do governador José
Marques Guimarães de 18 de fevereiro de 1890, p.14).
*
Carolina Munhoz nasceu em
11 de julho de 1854 e faleceu em 2 de junho de 1933, aos 78 anos (173). Casou-se em
primeiras núpcias com Eugênio Ferreira Luz e em segundas núpcias com seu primo
Manoel Martins Rocha, filho de Manoel Martins da Rocha e da irmã de CJM, Maria
Lícia (174).
Manoel Martins da Rocha
(provavelmente o sogro de Carolina, e não o marido homônimo), é citado no
relatório do presidente em exercício Agostinho Ermelino de Leão de 24 de
dezembro de 1870, p. 32. Ele integra uma comissão, nomeada por esse presidente
em 30 de abril desse ano, destinada a promover uma subscrição visando a
conclusão das obras da matriz de Campo Largo, cujos recursos complementariam o
“auxílio dos cofres provinciais”. A comissão era integrada ainda pelo
respectivo vigário e o tenente-coronel Francisco Pinto de Azevedo Portugal.
Conforme
nota publicada no DD (175), Carolina
Lícia Munhoz casou em 7 de janeiro de 1871 com Eugênio Ferreira Luz, filho do
major Vicente Ferreira da Luz. Este era dono de engenho de erva mate “movido a
força hidráulica no Barigui”, com “uma situação comercial lisonjeira”, segundo
Ermelino de Leão (176). Foram
padrinhos o Dr. José Cândido da Silva Murici (casado com uma irmã do noivo, de
acordo com F. Negrão) e o major Bento Florêncio Munhoz (irmão de CJM). A nota
do DD conclui afirmando que o ato teve lugar em oratório particular em casa do
pai da noiva. Carolina tinha então 16 anos.
Eugênio
Ferreia Luz é mencionado, na condição de 2º escriturário da Tesouraria
Provincial, no relatório do vice-presidente Agostinho Ermelino de Leão citado acima,
de 24 de dezembro de 1870-p. 26.
*
Francisca
Munhoz, nascida em 6 de abril de 1856, casou-se com o major Francisco de
Paula Ribeiro Vianna, “que foi Tesoureiro da Delegacia Fiscal de Curitiba”,
segundo F. Negrão. Ele também informa que o marido de Francisca era irmão do comendador
João Manoel Ribeiro Vianna e que ambos eram
netos, por parte de mãe, do primeiro prefeito de Curitiba, José Borges de
Macedo (177). De acordo com Maria Nicolas, João Manoel R.
Vianna (1853-1902) nasceu em Curitiba mas “transferiu-se para Antonina,
dedicando-se à indústria da erva-mate e do arroz e ao comércio atacadista”. Chefe
político local, coronel da Guarda Nacional, foi vereador, presidente da Câmara
Municipal de Antonina e deputado por várias legislaturas à Assembleia
Provincial (Estadual, depois de proclamada a República) (178). Acrescento
que era vinculado ao Partido Liberal, conforme se diz no DD de 26 de fevereiro
de 1886- p .1.
O presidente Luiz A.L.
de Oliveira Bello nomeou o então capitão Francisco de Paula Ribeiro Vianna 1º
suplente de juiz municipal do termo da capital, por ato de 10 de novembro de
1883, em substituição ao major Luiz Manoel Agner, que pediu exoneração desse
cargo, “visto ter de mudar sua residência”. Francisco era antes 2º suplente de
juiz municipal (cf. relatório desse presidente da província de 22 de agosto de
1884, p.6).
Deve
ter ocorrido com Francisco de P. Ribeiro Vianna o mesmo que com o seu cunhado
Florêncio José Munhoz, apresentado a seguir, o qual esteve alguns anos excluído
do Ministério da Fazenda, por ter se posicionado contra Floriano Peixoto na
época da Revolução Federalista, sendo depois reintegrado aos quadros
fazendários. O nome de Francisco consta ao lado do de Florêncio numa relação de
“ex-empregados de fazenda” publicada no Diário Oficial da União de 26 de junho
de 1896 (p.2, seção 1).
Assim
como Florêncio, nessa opção política, deve ter sido influenciado pelo
tenente-coronel Theophilo Soares Gomes (um dos líderes da Revolução Federalista
no Paraná, meio-irmão de sua esposa), Francisco deve tê-lo sido pelo seu irmão coronel
João Manoel R. Vianna, chefe político de Antonina, como foi dito acima, ao qual
Theophilo e os outros liberais da região eram associados.
Vale registrar ainda que o nome de Francisco
consta numa relação dos maçons da antiga Curitiba publicada no site Museu
Maçônico Paranaense, que também informa que ele nasceu em 5 de maio de 1851 (179).
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