6.2- (cont.)
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Florêncio José Munhoz (Fonte: álbum de família) |
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Julieta Soares Gomes Munhoz (Fonte: álbum de família) |
Florêncio José Munhoz, meu bisavô,
tomou o nome do pai de CJM. Nasceu em Curitiba no dia 21 de dezembro de 1857 (180). Nos anos de
formação, estudou em Curitiba e depois no Seminário Episcopal de São Paulo.
Abandonando os estudos eclesiásticos, ingressou na Tesouraria de Fazenda do
Paraná -- seguindo o exemplo de seus irmãos Alfredo e Caetano Alberto --
inicialmente como “praticante”, ocupando logo depois, mediante concurso, o
cargo de 2º escriturário. Em agosto de 1890 foi transferido, nesse mesmo cargo,
para a Alfândega de Paranaguá, subordinada, como a Tesouraria, ao Ministério da
Fazenda (havia ainda, como suas unidades descentralizadas na província, as
Mesas de Renda e as Coletorias). Um artigo de Francisco Negrão (181) -- que
também era escriturário em 1890 -- o menciona como um dos onze em atividade na Alfândega,
sob a chefia do Inspetor David Antônio Carneiro. F. Negrão informa ainda que
Caetano Alberto Munhoz -- o irmão de Florêncio -- foi nomeado Inspetor dessa
Alfândega em 1º de julho de 1890, mas só assumiu o exercício do cargo em 20 de
abril de 1891, tendo o deixado em 11 de setembro do mesmo ano. Retornando para
S.Paulo, ele se aposentaria em 1892 na Inspetoria de sua Tesouraria de Fazenda,
como vimos. Naquele período, portanto, Florêncio esteve subordinado a esse seu
outro irmão, convivendo com ele em Paranaguá.
Na
época da Revolução Federalista, Florêncio tomou partido a favor dos
antiflorianistas (“maragatos”), certamente influenciado pelo círculo social que
frequentava nessa cidade e também pelo tenente-coronel Theophilo Soares Gomes,
meio-irmão de sua esposa Julieta e um dos líderes do movimento revolucionário no
Paraná (chegou a exercer o governo do Estado por alguns dias, em janeiro de 1894-
v. a Cronologia Biográfica dele que elaborei e disponibilizei em http://tsoaresgomes.blogspot.com/).
Com a consolidação de Floriano no poder, Florêncio sofre as consequências da
sua opção política, e é demitido da Alfândega de Paranaguá em 1894 “por traição
à República”, como consta no respectivo decreto do governo central, juntamente
com alguns colegas. Mais tarde, porém, é reintegrado aos quadros da Alfândega.
Em 1900 seu nome é citado no “Almanaque Paranaense” (p. 146), como 1º
escriturário da Alfândega de Paranaguá. Nesse mesmo ano ele assina ata relativa
à inauguração do novo edifício do hospital da Santa Casa de Misericórdia de
Paranaguá, a cuja irmandade pertencia (assim como já pertencera seu avô
homônimo). Posteriormente, ocupa o cargo de “guarda-mor”, exercendo tais
funções em Paranaguá, Maceió e Santos, onde vem a falecer em 13 de novembro de
1909 (182).
O
casal teve cinco filhos: Hermínia (1883-1966), Franklin (1887-1912), Arabela
(1890-1982), Georgeta (1894-1945) e Evelina (1895-1961). Arabela casou com o
coronel Sílvio van Erven, chefe da Casa Militar e Chefe de Polícia no governo
Manoel Ribas (antes do Estado Novo). O escritor Herbert Munhoz van Erven (1908-1985),
meu pai, é filho desse casal.
No
jornal “Dezenove de Dezembro” encontrei as seguintes referências a Florêncio, a
primeira delas quando era ainda adolescente:
A
edição do DD de 4 de dezembro de 1872, p.2, publica relação dos alunos que
obtiveram “aprovação plena” nos
exames realizados no dia 30 do mês anterior,
na escola da 1ª.
cadeira do sexo masculino desta capital, sob a presidência do Sr. inspetor
paroquial, sendo examinadores os Srs. tenente-coronel João Manuel da Cunha,
reverendo Antonio Vicente da Cruz e o respectivo professor.
Dentre
os alunos aprovados constam os nomes de Florêncio José Munhoz e José Caetano
Munhoz. Florêncio tinha então 15 anos. Seu
irmão José Caetano era dois anos mais novo.
Concluída
a educação primária, Florêncio mudaria para S.Paulo para estudar as matérias do
ensino secundário no Seminário Episcopal. Confirma tal informação, que já me
havia sido transmitida pela tradição familiar, a nota abaixo, publicada no DD
de 9 de maio de 1877- p. 4:
CHEGADA- Chegou a
esta capital, vindo de S.Paulo onde se achava concluindo os preparatórios, o
Sr. Alberto José Gonçalves, filho do negociante desta praça Francisco José
Gonçalves. Tivemos ocasião de ler os atestados que esse nosso patrício trouxe
do seminário, os quais são presságio de auspicioso futuro. Chegaram também os
Srs. Antonio Carlos Ribeiro e Florêncio José Munhós, estudantes do mesmo seminário.
Dois
meses e meio depois, em 25 de julho de 1877, falecia CJM, repentinamente. Teria
Florêncio retornado ao Seminário antes desse fato? O certo é que abandonou os
estudos eclesiásticos, nessa ocasião ou em outra, conservando-se porém muito católico.
O jornal “Diario do Commercio”, de
Curitiba, em 12 de março de 1891, publicou o seguinte anúncio:
Florêncio José Munhós manda celebrar uma missa por
alma de seu amigo e padrinho padre Carlos Maria Terrier, falecido no Rio de
Janeiro.
Antonina, 11 de março
de 1891
Pesquisando na internet,
verifiquei que Carlos Maria Terrier era um capuchinho francês que veio para o
Brasil a fim de integrar o Seminário Episcopal de São Paulo. Os capuchinhos
franceses foram os fundadores e primeiros mestres daquele Seminário, de 1854 a 1878, quando então o
Seminário passou para padres seculares (comparando as datas, verifico que
Florêncio participou assim dessa
primeira fase do Seminário). A igreja de São Cristóvão situada na avenida
Tiradentes nº 84 no bairro da Luz, região central de São Paulo, fazia parte do
Seminário Episcopal, que abandonou o prédio aí localizado em 1927 (183).
No Seminário de S. Paulo estudaram destacadas figuras paranaenses
tais como o Monsenhor Manoel Vicente (1851-1909), que depois passou a lecionar
lá e chegou a ser seu Vice-Reitor; D.
Alberto José Gonçalves (1859-1945), antes referido, político (foi deputado
provincial e senador), vigário de Curitiba e depois bispo de Ribeirão Preto; o escritor Moisés
Marcondes (1859-1928); Alcides Munhoz (1873-1930), ensaísta e dramaturgo (184). Também foi
aluno desse Seminário o monsenhor Celso Itiberê da Cunha (1849-1930), nascido
em Paranaguá mas por muitos anos cura da catedral de Curitiba, irmão do
compositor e diplomata Brasílio Itiberê, ambos filhos do primeiro casamento do
Dr. João Manoel da Cunha (antes citado como examinador de Florêncio) com D.
Maria Lourença Munhoz da Cunha (185) (a propósito desta, embora nascida em Paranaguá e de sobrenome
Munhoz, F. Negrão não a menciona na “Genealogia Paranaense”; devia pertencer
aos Munhoz de origem mais antiga no Brasil, diferentemente dos ancestrais de
CJM).
Em 1880, aos 22 anos, Florêncio ingressa na Tesouraria de Fazenda na
província do Paraná como “praticante” (186). No ano seguinte, em 26
de fevereiro, ele e Arthur de Menezes Dória, outro praticante, são nomeados
“para exercerem provisoriamente os lugares de 2ºs escriturários” que se achavam
vagos naquela repartição (187). Anteriormente, em 11 de
fevereiro, o presidente nomeara os seguintes examinadores para avaliar, nas
disciplinas abaixo, os pretendentes às duas vagas de 2º escriturário existentes
naquela Tesouraria: I) aritmética e sistema métrico- Eng. Gottlib Wieland; II)
álgebra- dr. Francisco Antônio Monteiro Tourinho; III) escrituração mercantil- cap.
Joaquim Lourenço de Sá Ribas; IV) geografia e história do Brasil- dr. Constante
Affonso Coelho; V) inglês- dr. Francisco de Camargo Pinto; VI) francês- dr.
José Joaquim Franco Valle; VII) prática do serviço da repartição- 1º escriturário
Antônio Ferreira da Costa (188).
Florêncio José Munhoz, juntamente com Arthur de Menezes Dória,
aprovados nesses exames, seriam nomeados, por “títulos” de 19 de setembro de
1881, 2º escriturários da Tesouraria de Fazenda (189). Uma nota publicada no DD de 21 de maio de
1881- p. 3 mostra que os concursos públicos de então eram diferentes dos do
nosso tempo. Reservavam-se, prioritariamente, as vagas disponíveis para o
pessoal interno das repartições governamentais. Diz a nota da Tesouraria de
Fazenda do Paraná, assinada em 5 de maio, que se acha em concurso “novamente”
uma vaga de 2º escriturário
para o qual se poderão apresentar os empregados de 1ª.
entrância desta tesouraria e da alfândega de Paranaguá, podendo do mesmo modo
inscrever-se pessoas estranhas às ditas repartições, caso o número daqueles
concorrentes não exceda ao da vaga.
Em
1882, Florêncio foi nomeado “alferes” da 1ª. Companhia do 1º Batalhão de
Reserva da Comarca da Capital da Guarda Nacional, conforme o DD de 25 de
fevereiro desse ano, p. 3. Florêncio
pagou 40$000 de selo por essa patente, informa o DD de 4 de março, p. 3. Dois
anos e alguns meses mais tarde, ele e Edmundo Soares Gomes (irmão de sua
esposa?) constam de relação dos qualificados para o serviço ativo (cf. DD de 5
de julho de 1884, p. 3-4).
O
“Dezenove de Dezembro” também mostra que Florêncio se interessava pelo convívio
social. Ele integrou, como 2º
secretário, a diretoria, para o segundo semestre de 1881, da recém-formada
sociedade “Cavalheiros do Luar” (190). O presidente
da sociedade é o tenente Benedito Pereira da Silva Carrão (suponho que o mesmo
Benedito Carrão que redigia a “Gazeta Paranaense” (fundada em 1876), órgão do
Partido Conservador, e também “O Paranaense”, em 1879-80, com Justiniano de Mello e
Silva). O 1º secretário é o alferes
Miguel Schleder e o orador, Manoel de Souza Dias Negrão, cunhado de Florêncio
(casado com sua irmã Augusta). Havia ainda um tesoureiro, um Conselho Econômico
e uma Junta Consultiva. Nos dias 6, 9 e 27 de julho de 1881 o jornal publica
convites para os sócios participarem de reuniões nos dias subsequentes. No
último deles a sociedade é identificada como “S.L.R Cavalheiros do Luar” (191). Logo
ficamos sabendo pelo jornal (192) o significado de todas as letras por uma carta,
procedente de Barbacena, do Dr. Abílio César Borges (o conhecido educador,
retratado caricaturalmente em “O Ateneu” de Raul Pompéia) dirigida à entidade,
em que ele louva a idéia da criação da sociedade literária recreativa
Cavalheiros do Luar e lhe oferta 500 exemplares de sua obras. Uma semana
depois, pelo DD (193), a S.L.R.
Cavalheiros do Luar comunica “aos
sócios e convidados que a 4ª. partida (194) terá lugar sábado, 13 do corrente, no salão Lindemann, à rua de
S.Francisco”.
E conclui assim o aviso: “Pede-se toda
abstenção de luxo” (essa era uma recomendação usual, indicando que devia
haver preocupação excessiva dos convidados com a sua aparência, nessa Curitiba
provinciana, de pouca vida social).
Outra
edição do DD informava que na segunda-feira, dia 15 de agosto, no mesmo salão
Lindemann teria lugar “o último
concerto vocal e instrumental dado pelo artista lírico Scolari Giovani,
coadjuvado por algumas senhoras e cavalheiros amadores” (195). No ano seguinte, 1882, esse salão
receberia a Companhia Dramática Julieta dos Santos, que levou à cena ali o
poema “O Melro” de Guerra Junqueira, além de um drama e uma comédia. O jornal (196) que traz
matéria sobre essas apresentações, ocorridas em 29 de outubro, um domingo,
salientaria o “magistral desempenho
dado pela atrizinha Julieta dos Santos ao idílio- O Melro”. Também “O
Porvir” de 31 de outubro de 1882- p.3 contém matéria elogiosa sobre a
apresentação dessa companhia, destacando a participação de Julieta na peça
“Georgeta a cega” (em que ela faz o papel da cega), além de “O Melro”. Foi a
essa Companhia que o nosso maior poeta simbolista, Cruz e Souza, quando jovem
(com vinte e poucos anos), se integrou, na condição de ponto, percorrendo todo
o Brasil, de norte a sul. Dada a sua grande admiração pela atriz-menina, chegou
a publicar vários sonetos sobre ela (197).
Antes
de Curitiba, Julieta dos Santos se apresentou em nosso litoral. “O Porvir” de 7
de setembro de 1882, na p. 4, informa que brevemente chegaria a Paranaguá a companhia
dramática de Moreira de Vasconcellos
da qual faz parte a
célebre rio-grandense Julieta dos Santos, menina de 9 anos de idade, que tem
revelado um gênio na arte dramática, tendo por isso colhido inúmeros aplausos
das platéias e da imprensa fluminense.
A
edição do dia 30 de setembro do mesmo jornal informa que ela estava então se
apresentando em Antonina. Alguns anos mais tarde, “O Futuro” de Paranaguá,
edição de 7 de novembro de 1885- p.2, anunciava seu retorno à cidade.
A
pequena atriz causou tão boa impressão no meio curitibano que deu nome a uma
sociedade dramática que os amantes do teatro, inclusive Florêncio, fundaram
nessa época, como se verá abaixo.
Em 1880, Florêncio (empregado
como “praticante” da Tesouraria de Fazenda) casou com outra Julieta, a filha do
comerciante português Manoel Soares Gomes (1829-1891), estabelecido na rua do
Rosário “canto do Largo da Matriz” desde 1877 (198), e de D. Rita Adelaide Coutinho (1838-1911).
Antes de prosseguir, gostaria de
incorporar aqui algumas informações que obtive sobre Manoel Soares Gomes -- importante
no comércio da época e membro de destaque da comunidade lusa local -- ampliando
assim a nossa visão de Curitiba no tempo do Império.
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Fonte: Casa da Memória |
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Manoel Soares Gomes (Fonte: álbum de família) |
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Rita Adelaide Coutinho Soares Gomes (Fonte: álbum de família) |
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Julieta Soares Gomes Munhoz (Fonte: álbum de família) |
O sogro de Florêncio nasceu na cidade do Porto em 1829 e emigrou
para o Brasil ainda jovem. Casou aqui com D. Maria Gonçalves Moraes Soares,
nascida na província de Santa Catarina, filha do tenente-coronel Bento
Gonçalves de Moraes Cordeiro. Aos 24 anos residia na vila de Antonina, onde
nasceu seu filho Theophilo.
Por anúncios publicados no jornal “Dezenove de Dezembro”
depreende-se que houve uma sociedade entre Manoel Soares Gomes e Domingos Solis
Garcias, que durou de janeiro de 1855 a agosto de 1856, aquele residente em
Antonina e este em Curitiba. Essa sociedade, denominada “Soares & Garcias”,
mantinha um armazém “de secos, molhados e ferragens”, situado na rua da Carioca
(atual Riachuelo) nº 27, em Curitiba, gerenciado por Garcias. Mas edições do mesmo jornal de abril e julho
de 1856 publicam anúncio de uma casa de relojoaria e jóias de Manoel Soares
Gomes em Paranaguá, onde também consertavam-se relógios e caixas de música.
Em 1864, Manoel casou em 2as. núpcias com D. Rita Adelaide Coutinho
no Desterro, atual Florianópolis. O casal teve três filhos: Julieta, aí nascida
em 1866, Edmundo e Franklin (este nascido no Rio de Janeiro em 1872).
O “Dezenove de Dezembro” registra, em notas relativas ao movimento
do porto de Paranaguá, a presença de Manoel Soares Gomes dentre os passageiros
de navios procedentes do Desterro e Rio de Janeiro ou com destino a essas
localidades.
Em 1877 Manoel estava estabelecido comercialmente em Curitiba. A
“Província do Paraná”, na edição referida acima, de 17 de outubro, publica
anúncios de sua casa importadora, estabelecida na rua do Rosário, junto à atual
praça Tiradentes. Por outro lado, a
edição de 16 de dezembro desse mesmo ano, p.4, de “O Paranaense”, anuncia que
M.Soares Gomes e Cia oferecem ao público “uma grande e profusa coleção de
artigos importados dos Estados Unidos para uso do comércio, indústria, lavoura,
artes, ciências, economia doméstica etc etc”, artigos esses que poderiam ser
vistos em seu armazém em Curitiba.
Em outro anúncio, publicado em “O Paranaense” de 10 de janeiro de 1878-
p. 4, consta o seguinte:
Manoel Soares Gomes e Comp. -- únicos agentes na Província do Paraná da Companhia Lidgerwood, fabricantes nos Estados Unidos e Inglaterra – tem sua casa na travessa da rua do Rosário, e vende baratíssimo máquinas e instrumentos agrícolas de todos os sistemas e formas que o progresso nos tem apresentado e artigos americanos, como sejam: cadeiras, mobílias, relógios, trolles, carrinhos, pianos, arados, debulhadores, querosene, farinha, lampeões e grande infinidade de objetos que seria longa a sua enumeração.
Manoel Soares Gomes e Comp. -- únicos agentes na Província do Paraná da Companhia Lidgerwood, fabricantes nos Estados Unidos e Inglaterra – tem sua casa na travessa da rua do Rosário, e vende baratíssimo máquinas e instrumentos agrícolas de todos os sistemas e formas que o progresso nos tem apresentado e artigos americanos, como sejam: cadeiras, mobílias, relógios, trolles, carrinhos, pianos, arados, debulhadores, querosene, farinha, lampeões e grande infinidade de objetos que seria longa a sua enumeração.
No ano seguinte, o
“Dezenove de Dezembro” de 30 de janeiro de 1879
traz anúncio (em alemão) dos vendedores de farinha de trigo Amazonas M. &
Oliveira e M. Soares Gomes & Cia. Também no “Almanak Administrativo,
Mercantil e Industrial da Província do Paraná para 1880” organizado por José
Ferreira de Barros, Rio de Janeiro, 1879, p. 109, consta dentre os comerciantes
(secção “Objetos Americanos”) o nome da firma “Soares Gomes & Cia”.
Ainda em “O Paranaense”
(edições de 9 e 14 de setembro de 1879, ambas
na p. 4), constam anúncios de M.Soares
Gomes e Cia, relativos à venda de
máquinas de tijolos e telhas (a serem movidas por animais) assim como fogões
(americanos e nacionais), arados, moinhos, bombas, carneiros hidráulicos, louça
de cozinha, além de máquinas de Singer (“para
uso de famílias, alfaiates, sapateiros, seleiros etc”), máquinas a vapor,
máquinas de picar capim etc., cujos únicos agentes aqui eram M.Soares Gomes e
Cia.
Em 1880, quando D.Pedro II inaugurou em Curitiba o edifício do
Hospital da Santa Casa de Misericórdia, Manoel estava presente à cerimônia. Foi
uma das 162 pessoas que assistiram o ato e assinaram a respectiva Ata,
transcrita por Francisco Negrão em “Memória da Santa Casa de Misericórdia de
Curitiba”- Curitiba, 1932, p. 21.
Mais tarde, em 1888, a “Gazeta Paranaense” publica, na edição de 12
de julho, correspondência enviada ao jornal por um grupo de 10 empresários --
liderado pelo Barão do Serro Azul e integrado por Manoel Soares Gomes -- que
reivindica a criação de um banco para a Província do Paraná, projeto proposto
por Frederico Perracini.
Em 1889, na “Galeria Ilustrada” nº 15, de 10 de junho, consta
anúncio de M.Soares Gomes, referido como “importador de máquinas a vapor,
máquinas de costura, mobílias, instrumentos de lavoura e artigos de ferragem,
louça, porcelanas, cristais etc. dos Estados Unidos”.
Ainda em 1889, mas após a proclamação da República, o nome de
Manoel Soares Gomes aparece no topo de um rol de cem comerciantes que
encaminham documento ao governador Francisco José Cardoso Jr. felicitando-o
pelo modo como conduziu o Estado -- mantendo o “princípio de autoridade” e
assegurando a “ordem pública” -- por ocasião dos acontecimentos políticos que
acabavam de ocorrer (instauração da República). Segundo o historiador David
Carneiro, tal movimento daria como resultado a criação da Associação Comercial
do Paraná, ocorrida em julho de 1890.
Manoel Soares Gomes faleceu em Curitiba em 1891, aos 62 anos
incompletos.
Sua filha Julieta, como disse, nascera
no Desterro em 1866. Quando casou, em 11 de outubro de 1880, tinha apenas 14
anos enquanto Florêncio José Munhoz, 22. O casamento foi realizado em cerimônia
quase secreta, pois não contava com o apoio da família, segundo ouvi em casa.
Na realidade, não devia contar com o apoio dos pais da noiva, pois os de
Florêncio já haviam morrido. Além disso, verifiquei nos assentamentos em livro
próprio, no acervo da Catedral Metropolitana, que o casamento foi celebrado
pelo padre Jordão Homem Pedroso e ocorreu na capela de N.Sra do Rosário “que
serve de Matriz a esta paróquia de Curitiba, donde os contraentes são
fregueses”. Foram testemunhas o tenente-coronel Antonio Ricardo Lustosa de
Andrade e o tenente Caetano Alberto Munhoz, tudo conforme os registros feitos
mais tarde (em 25 de março de 1882) no livro de casamentos pelo padre Júlio
Ribeiro de Campos, Vigário Geral Forense (que tinha competência para dispensar
os proclamas, e outras formalidades).
Esse padre era amigo do noivo.
Ele também estudara no Seminário Episcopal de S.Paulo, alguns anos antes de
Florêncio. Fora nomeado pelo bispo da Diocese de
S.Paulo, em 2 de abril de 1879, o primeiro Vigário Geral Forense” da província
do Paraná, cuja escolha recaía assim sobre um sacerdote nascido na capital
(Curitiba só viria a ser sede de bispado em 1892) (199). Dentre as suas
atribuições, constava a de “dar o seu parecer sobre a conveniência da criação e
extinção de paróquias e sobre a alteração de limites das mesmas, ficando
dependente da autoridade diocesana a instituição ou aprovação canônica
respectiva”, conforme consta no relatório do presidente Manuel Pinto de Souza
Dantas Filho de 16 de fevereiro de 1890, p.24.
O padre Júlio faleceria em 1885,
com apenas 35 anos de idade. Florêncio foi uma das pessoas que o assistiram no
leito de morte, conforme consta em matéria publicada no “Dezenove de Dezembro”
de 12 de abril desse ano, p. 1-3 (na edição do jornal do dia anterior, p. 4, é
Florêncio quem convida amigos e parentes para a missa a ser rezada pela alma do
padre Júlio)..
Julieta era meia-irmã de Teophilo Soares Gomes
(1854-1935), o político “maragato” e dramaturgo paranaense, filho do primeiro
casamento de seu pai. Menos de um ano
antes de seu casamento, ela é referida numa nota da “Província do Paraná” de 2
de dezembro de 1879- p.2 que transcreve um convite de um grupo de “jovens
paranaenses desta capital” para um baile oferecido ao presidente da província
Manoel Pinto de Souza Dantas Filho, como “manifestação de apreço e
reconhecimento”/.../ “pelos benefícios que há feito e interesse que tem
demonstrado em relação ao Museu desta capital”. O baile, aliás, será realizado “no
novo e vasto salão do Museu”. As moças que assinam o convite são: Francisca de
Menezes, Júlia Godoy, Maria Eugenia Ramos, Escholastica Enéas, Maria Martins,
Bertholina Silva, Rosa da Fonseca, Escholastica Gonsalves, Maria da Conceição
Lustosa, Maria Augusta Franco, Maria Clara Pinheiro, Maria Candida Castro, Francisca
Eufrasina d’Assumpção, Joaquina Francisca de Andrade, Julieta Soares e Maria
Barbara de Leão. A edição do mesmo
jornal do dia 10 de dezembro, p.2, faz um relato do baile, realizado no dia 8,
a partir das 8 horas da noite. “Foi uma reunião esplêndida pela concorrência,
arranjo do salão e serviço do chá”. Nesse texto, a matéria refere-se à “exma.
sra. do sr. Soares Gomes” (D. Rita Adelaide) que fez o bouquet (“um primoroso trabalho”) entregue ao presidente Dantas por
uma das jovens integrantes da comissão de recepção.
O DD de 12 de setembro de 1883, p.2, refere-se de forma
elogiosa aos espetáculos teatrais promovidos pelas sociedades Grupo de Amadores
e Julieta dos Santos. Na p.3 o jornal informa a composição da nova diretoria
(eleita) da Sociedade Julieta dos Santos.
Florêncio José Munhoz figura aí como vice-presidente. O presidente é João
Bernardino Carneiro, o 1º secretário José Craveiro de Sá, o 2º secretário
Firmino Castello Branco, o tesoureiro Horácio F. dos Reis e o procurador
Maximiano José Martins. Logo abaixo, na mesma página, consta matéria elogiosa
sobre os dois espetáculos (um drama e uma comédia) dados por essa sociedade,
nos dias 7 e 8 de setembro. João Carneiro e Horácio Fagundes, membros como
vimos da diretoria, são dois dos seis atores que participaram das encenações. É
possível que Florêncio, então com 25 anos,
também fizesse teatro. Afirma a matéria do “Dezenove de Dezembro”:
/.../ É bem difícil uma mocidade ainda noviça
no manejo da arte de Thalia se mostrar vigorosa nesses arrobos (sic) que, pela
fantasia, nos deixa ver a realidade dos atos da existência humana. Parabéns a
esses belos moços que se mostram corajosos de querer firmar o espírito social,
implantando a verdadeira emulação na sociedade presente e futura.
Aproximadamente um mês mais tarde, em outubro,
o jornal (200) publica esta nota,
relativa a novas apresentações da sociedade:
Espetáculo- A
sociedade dramática particular Julieta dos Santos levou à cena, no dia 7 do
corrente, o drama José, a cena cômica O sacristão de S. Nunes e a comédia Os
dois criados felizes, destinando o seu produto à compra de paramentos para a
igreja matriz. Foi bastante concorrido.
Florêncio
pertencia à Irmandade do SS. Sacramento da
Matriz de Curitiba. Nessa condição, participava da “guarda do Senhor” na
Semana Santa, conforme o costume da época. No DD de 17 de março de 1883, p. 4,
consta nota dessa Irmandade contendo
a “Relação dos respectivos irmãos que têm de fazer a guarda do Senhor”. Os membros
da Irmandade que ali constavam, aos pares, seriam substituídos, a cada duas
horas, por outros dois, desde o meio-dia da quinta-feira santa até as 12 horas
da noite da sexta-feira. Na quinta-feira, das 12 às 2 horas da manhã, faria a
guarda Florêncio José Munhoz e Antônio Carlos Ribeiro de Andrade (seu antigo colega
do Seminário de S. Paulo); das 2 às 4 horas da manhã, Alfredo Caetano Munhoz (seu
irmão) e Manoel de Souza Dias Negrão (cunhado de Alfredo). Outros nomes citados
nessa relação: Dr. José Lourenço de Sá Ribas, Dr. Generoso Marques dos Santos,
ten-cel Benedito Enéas de Paula, Dr. Agostinho Ermelino de Leão, Dr. Joaquim de
Almeida Faria Sobrinho etc. No ano seguinte, conforme o DD de 10 de abril de 1884, p. 4, dentre os diversos
pares referidos, consta aquele formado pelo major Mathias Taborda Ribas (tio de
Florêncio, casado com Balbina Lúcia, irmã de CJM) e ten-cel Manoel José da
Cunha Bittencourt.
Em 1884, Florêncio, com a esposa Julieta, juntamente
com seu irmão Alfredo (dirigente local da Tesouraria de Fazenda), esposa
(D.Rita de Assis de Oliveira Munhoz) e filha, Francisca Munhoz, participam de
uma grande festa da elite curitibana, objeto de duas extensas matérias numa
mesma edição do DD (201). A festa -- uma “soirée travestie” como
a chama o cronista, em seu texto recheado de expressões em francês --
realizou-se no dia 23 de junho na residência do coronel Carlos Vieira da Costa
e de sua esposa D.Zelie Costa, “diretora do
colégio de Santa Tereza” (o pai de Zelie, professor Christovão Vieira de
Freitas, também está presente; ele é mencionado como “o infatigável sacerdote da educação secundária no Brasil”). O
“baile à fantasia” realizou-se nos amplos salões da residência do casal e ali “um grupo adorável de rostos alegres e
felizes /.../ voava nas asas douradas das valsas, das polcas, dos lanceiros,
das quadrilhas e das mazurcas”. Assentada ao piano estava D. Presciliana
Costa, “a quem muito deve esta cidade
pela aclimação de uma escola estética de canto”. Junto dela, duas
alunas, Elvira Costa, contralto, e Rosa Fonseca, soprano, executaram, na
ocasião apropriada, um dueto da “Fosca” de Carlos Gomes, seguida mais tarde de
outro dueto, de “Il Guarani” (é possível que Julieta, a esposa de Florêncio, que
estudou canto lírico, conforme a tradição familiar, também tivesse sido aluna
de D. Presciliana Vieira da Costa. A propósito, sua escola era uma das sete
particulares existentes na capital em 1879; possuía então 7 alunos do sexo
masculino e 17 do feminino (cf. Anexo A do relatório do presidente Manuel Pinto
de Souza Dantas Filho de 16 de fevereiro de 1880). O cronista descreve em
detalhe as “toilettes” e fantasias das convidadas, uma a uma. Estes os
comentários que faz aos membros da família Munhoz:
-Mme. Julieta Munhoz. A
bela Filha da Hungria: robe satin bleu ciel à manchettes blanches. Dentelles
d’Angleterre. Bouquet de roses dr. Enault no colo. Uma esplêndida capa
guarnecida de pelúcia. Na cabeça, um gorro branco com plumas. Colar de pérolas ao
pescoço e um elegante éventail de penas. Éblouissante e edênica.
-Mme.
Munhoz: robe satin bleu mer. Simpática, amável e spirituelle.
-Mlle. Francisca
Munhoz. A Italiana.: robe rouge bordado a ouro. Corpete verde. Na
cabeça, um lenço escarlate. Angélique et splendide.
Dentre as fantasias adotadas pelas senhoras e
senhoritas, são mencionadas: a Folia, a Noite, a Gondoleira, a Italiana, a
Húngara, a Feiticeira Cartomante, Joana d’Arc, o Telégrafo, a Costureira, a
Justiça, a Jurisprudência e a Camponesa.
Dentre os cavalheiros, havia a presença de um Napoleão I, um rei Luis
XIV e de o Espanhol. Além dos já mencionados, estavam presentes o comendador
Ildefonso Correa, o chefe de polícia Dr. Walfrido, Jesuíno Lopes (diretor do
“Dezenove de Dezembro”), Dr. Westphalen, coronel Assumpção etc. A festa, que
teve um buffet caracterizado “pela
diversidade de bebidas e por infinita qualidade de doces”, prolongou-se
até às 4 horas da manhã.
O anfitrião, Carlos Vieira da Costa, integrava a Delegacia
da Inspetoria Geral da Instrução Pública da Corte na província do Paraná pois
assina edital da secretaria dessa Delegacia publicado no jornal no começo de julho de 1884 (202).
Esse edital
divulga relação dos inscritos para os “exames gerais de preparatórios” a serem
realizados proximamente (a aprovação neles era pré-requisito para o acesso aos
cursos superiores do Império). Francisca Cândida Munhoz, filha de Alfredo, inscreveu-se
em português, francês e geografia, e nessas matérias seria “aprovada plenamente
com distinção” (ela prestou esses exames “perante a delegacia da instrução
primária e secundária” da Corte) (203). No ano seguinte, também seria “aprovada plenamente” em inglês e aritmética
(204). Francisca
era aluna do “acreditado” colégio Santa Tereza, dirigido por D. Zelie Costa,
esposa de Carlos Vieira da Costa (205).
No mesmo ano de 1884, o DD de 9 de dezembro, p. 4,
traz matéria sobre outra soirée, esta realizada no dia 7 e “ofertada”
pelo Cel. Vieira da Costa ao “estado-maior de S.A. o Sr. Conde d’Eu”, então em
visita ao Paraná (ele e a princesa Isabel inaugurariam a estrada-de-ferro
Curitiba-Paranaguá). Compareceram oficiais do 3º Regimento de Artilharia e 2º
Corpo de Cavalaria com suas famílias, “bem como grande número de damas e
cavalheiros de nossa mais escolhida sociedade”. /.../ “A soirée, de
acordo com o gosto moderno, constou alternadamente de dança, música e canto”. A
Sra. Tamplin, “conhecida professora de música”, fez-se ouvir ao piano, enquanto
outras senhoras “cantaram trechos de diversas óperas”, conforme programação aí
transcrita, que incluiu “Amore, valsa para canto, por Julieta
Munhós”. Além das já citadas, a nota
menciona as senhoras Elvira Costa, Rosa Fonseca, Graça Fonseca, Francisca
Menezes, Zelie Costa e Júlia Godoy (muitas delas referidas antes, no convite ao
baile em homenagem ao presidente Dantas Filho, realizado cinco anos atrás. Em fevereiro
de 1885, os nomes de algumas constam numa matéria assinada pelo presidente do
Club Abolicionista Paranaense, Castro Lavor, publicada no DD (206),
que relaciona senhoras e cavalheiros que se
dispuseram a angariar prendas para as quermesses a serem realizadas em março,
visando levantar fundos para emancipar escravos. Como se vê, nessa época essa
questão, embora tardiamente, já sensibilizava a elite local).
Florêncio foi vítima de perseguição política, o que
ocorria tanto em governos liberais como conservadores. No caso, ocorreu no tempo do presidente
Brasílio Machado, do Partido Liberal, a julgar pelas afirmações do deputado
Manoel Euphrasio Correia em um discurso pronunciado na Assembleia Geral e publicado
em 19 de julho de 1885, p.1-3, pelo semanário “O Futuro”, de Paranaguá, que apoiava
o Partido Conservador. Florêncio teria feito um comentário que Brasílio não
gostou, em reunião particular, sobre o empenho do presidente em eleger seus
candidatos liberais às duas vagas da província do Paraná na Assembleia Geral (ou
Câmara dos Deputados). Em razão disso, ele procura afastá-lo da Tesouraria e do
meio local, mandando-o apresentar-se no Ministério da Fazenda, no Rio de
Janeiro. Alfredo, chefe do irmão, envia oficio ao presidente encaminhando
pedido de Florêncio para que ele reconsidere sua decisão. Mas este é o despacho
do presidente Brasílio, datado de 19 de novembro de 1884 e publicado no “Dezenove
de Dezembro” (207):
Ao inspetor da tesouraria de fazenda- Declaro a v.s., em resposta ao seu
ofício de hoje, que, não achando atendível o pedido feito pelo 2º escriturário
dessa repartição Florencio José Munhós, fica-lhe marcado o prazo de 24 horas,
sob as penas da lei, a fim de seguir ao seu destino.
Brasílio, em dois outros despachos que constam no
mesmo “Expediente da presidência”, manda lhe darem passagens para todo o
trajeto, de diligência de Curitiba a Antonina, e de navio a vapor, “por conta
do ministério da fazenda, até à Corte”, a fim de viabilizar a sua decisão. Florêncio não cumpre a determinação do
presidente, preferindo apelar diretamente ao conselheiro Dantas, chefe do gabinete
imperial e também do Partido Liberal, cujo filho fora presidente da província
do Paraná, a quem a família de sua esposa era ligada politicamente. Ele lhe responde
por “um telegrama ambíguo”, segundo Euphrasio Correia, que não resolve o
impasse. O presidente Brasílio então o suspende do exercício do cargo de
escriturário da Tesouraria a partir de 21 de novembro de 1884,
responsabilizando-o pelo crime do art. 154 do Código Criminal do Império (208). Em consulta a esse Código, verifiquei que tal artigo,
contido no Título dos crimes da administração pública e no Capítulo relativo
aos empregados públicos, trata do descumprimento de ordem superior, prevendo
pena de 1 a 9 meses de suspensão.
Brasílio em seguida encaminha o processo ao juiz de
direito da comarca a fim de que “torne efetiva aquela responsabilidade
criminal” (cf seu despacho no “Expediente da presidência” de 23 de dezembro de
1884, publicado no DD do dia 30, p.1). O caso se encerra com a decisão do
Tribunal de Relação favorável a Florêncio. O Tribunal decide pela “não pronúncia”
dele, por unanimidade, deixando sem efeito assim a sua suspensão da Tesouraria.
É o que noticia “O Futuro” de 3 de maio de 1885, p.2. Mais tarde, na edição de
19 de julho, p.1-3, o jornal transcreve o discurso de Euphrasio Correia
proferido na sessão de 6 de julho, em que relata o episódio e nos forneceu as
razões para os despachos que constam no “Dezenove de Dezembro”. Euphrasio diz ali
que as medidas do presidente eram “para incutir o desânimo no espírito de meus
amigos”, chama Florêncio de “distinto empregado da Tesouraria Geral”, de “honrado
escriturário”, e critica (corretamente, a meu ver) Brasílio por “tomar uma
vingança, pequena e infeliz” contra ele.
Em
1887, Florêncio continuava a integrar a equipe de funcionários da Tesouraria da
Fazenda, em Curitiba, subordinado a seu irmão mais velho, de acordo com citação
de seu nome numa carta dos funcionários de Alfredo Munhoz, em que estes o
cumprimentam pelo aniversário (209).
No
final do Império, o DD de 15 de outubro de 1889- p.3 publica edital da
Tesouraria, assinado por Florêncio, na condição de secretário da “comissão das
estradas estratégicas do Paraná”, comunicando que aquela repartição receberá
propostas para o fornecimento, à força (do Exército) que acompanha tal comissão,
dos gêneros alimentícios e outros arrolados em anexo ao edital, “organizado
pelo Chefe da Comissão” (os fornecedores deverão transportar esses gêneros de
Curitiba para “Porto da União” e Guarapuava,
ou além). Mas logo após a instauração da República, o governo provisório
resolve “fazer recolher à capital federal o chefe da comissão encarregada da
fundação da colônia militar na foz do rio Iguaçu e da abertura de estradas
estratégicas neste Estado” (cf. DD de 7 de dezembro de 1889- p.2). A colônia já
estava fundada em novembro de 1889, conforme o relato do sarg. José Maria de
Brito, da expedição militar que veio para o Paraná em 1888 sob o comando do
cap. Belarmino de Mendonça com tais objetivos (210).
A primeira dessas
“estradas estratégicas” deve ter sido a de Porto da União a Palmas, referida no
relatório do presidente Brasílio Augusto Machado d’Oliveira de 15 de setembro
de 1884, p. 19. Ele informa aí que já estava na província a comissão militar
dirigida pelo engenheiro capitão Belarmino Augusto de Mendonça Lobo encarregada
(pelo governo central) de abrir uma estrada de rodagem entre Porto da União e a
vila de Palmas, “há muito reclamada por interesses de ordem militar, política e
industrial”. Naquela época, essa ligação era apenas “um caminho de cargueiros,
de trânsito muito difícil e moroso”.
Em
uma nota datada de 12 de dezembro de 1889 publicada no DD (211), o vigário
da matriz de Curitiba Pe Alberto José Gonçalves, diretor da “Congregação de N.Sra da Luz”, nomeia
Florêncio procurador da entidade, encarregado da cobrança dos seus “anuais”. As
outras pessoas então nomeadas para a diretoria dessa Congregação foram:
provedor: Dr. Trajano Joaquim dos Reis; tesoureiro: capitão Sesinando de Sá
Ribas; secretário: Gabriel Pereira; mesários: comendador Antônio Martins
Franco, Augusto de Assis Teixeira, Ciro Veloso, Dr. Cristiano Ottoni Jr, major
João Lustosa de Andrade, capitão Constante de Souza Pinto.
Em
26 de agosto de 1890, Florêncio é nomeado 2º escriturário da Alfândega de
Paranaguá, conforme está registrado no Diário Oficial da União dessa data (p.
9, seção 1), transferindo-se assim para essa cidade.
*
José
Caetano Munhoz,
nascido em 4 de julho de 1859 (212),
casou-se com Augusta Patusca. “Foi importante negociante em Santos”, segundo F.
Negrão, que também informa que sua filha, Carlota, era “hábil pianista”, tendo
realizado “um importante concerto musical em Curitiba em Dezembro de 1925” (213).
Sobre ele diz Alcides
Munhoz: “José Caetano Munhoz, seguindo a
carreira do comércio, após haver saído da Escola Militar do Rio de Janeiro, fora,
a convite do Conde de Pinhal, Presidente do Banco de S. Paulo” (214).
Aos 19 anos, em agosto
de 1878, José Caetano encontrava-se domiciliado em Montevidéu segundo menção a
ele no processo de inventário de seu pai, tratando de assuntos relacionados aos
interesses dos herdeiros junto ao consignatário da erva-mate beneficiada nos
engenhos de CJM, sediado na capital uruguaia (Silva & Irmão).
Por uma menção, no DD de 29 de dezembro de
1880- p. 2, ao requerimento encaminhado ao governo provincial por José Caetano
Munhoz, então com 21 anos, obtém-se a informação de que ele forneceu alimentos
para os trabalhadores da estrada da Graciosa até agosto de 1880 (como CJM
falecera em 1877, e no final de abril de 1879 ocorreu o incêndio de grandes
proporções em seus engenhos, causando grandes prejuízos à família, suponho que
essa foi uma das possibilidades econômicas então exploradas para obter renda. Outra
seria a tentativa de seus membros de se estabelecerem comercialmente, como indica
o seguinte anúncio, publicado em “O Paranaense” de 15 de fevereiro de 1880, p.
4:
Atenção
MUNHÓS
IRMÃOS
participam
que acabam de abrir
uma
casa especial de armarinho,
moda, perfumarias,
objetos de
escritório
e charutaria à
rua
Fechada nº --
(também o DD de 21 de
fevereiro de 1880, p. 4, publica anúncio semelhante).
José Caetano estudou no
Instituto Paranaense (antecessor do atual Colégio Estadual do Paraná) que desde
1879 funcionava junto com a Escola Normal na rua Aquidabã (215).
Ele é um dos 25 alunos
signatários de uma “manifestação de júbilo e gratidão” dirigida ao presidente
da província Carlos de Carvalho, publicada no DD de 5 de julho de 1882- p.
4. Os estudantes elogiam a atitude do
presidente de defender a continuidade da realização aqui dos “exames
preparatórios” que o governo geral queria suspender, como medida de economia.
Tais exames objetivavam ”preparar para os cursos superiores do império”.
Nota-se
assim que os filhos mais novos de CJM estudaram em colégios de Curitiba, em
seminário ou escola militar de outras cidades, ao contrário dos dois mais
velhos (Alfredo e Caetano Alberto), que estudaram no colégio Köpke, em Petrópolis. Isso
reflete certamente uma piora da situação financeira da família e também o maior
desenvolvimento de Curitiba, ao oferecer mais oportunidades de estudo na
própria cidade natal.
Ainda
em 1882, há mais duas menções a José Caetano Munhoz no jornal.
O DD de 2 de agosto desse
ano, p. 3-4, publica o resultado dos “exames gerais de preparatórios” que se
realizaram no mês anterior, de 17
a 24 de julho: José Caetano Munhoz foi “aprovado com
distinção” em português e “aprovado plenamente” em geografia. Na mesma ocasião,
o jovem Emiliano Perneta (1866-1921) foi “aprovado plenamente” em latim.
O DD de 20 de setembro
de 1882- p.1 informa a nomeação de José Caetano como tenente da Guarda Nacional
(da 6ª. Companhia, do 1º Corpo de Cavalaria).
Depois de 1882 ele não
é mais mencionado no jornal, exceto nesta nota publicada no DD de 27 de julho
de 1888- p. 2:
Recebemos um folheto
sob o título de “Balanço Mercantil”, produto do nosso inteligente
comprovinciano Sr. José Caetano Munhoz, guarda-livros em Santos. Agradecemos
a oferta.
Nesse intervalo de
tempo, entre 1882 e 1888, José Caetano deve ter se mudado para Santos, onde já
se encontrava Caetano Alberto desde 1883 (216).
*
Maria Leocádia Munhoz nasceu em 3
de dezembro de 1860 (217). Casou-se em 1as. núpcias com o coronel Bento
Munhoz da Rocha (seu primo, filho de Maria Lícia, irmã de CJM) e em 2as. núpcias
com o coronel Manoel Bonifácio Carneiro. É filho de seu primeiro casamento
Caetano Munhoz da Rocha (1879-1944), que foi presidente do Estado, pai do ex-governador
Bento Munhoz da Rocha Neto (1905-1973). Por aí se vê que eles eram,
respectivamente, neto e bisneto de CJM.
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