6.2- Os filhos do 1º casamento
Dentre os
onze filhos do casal João Gonçalves Franco-Escolástica Angélica Bernardina
contava-se minha trisavó, Francisca Cândida de Assis Franco, 1ª esposa de CJM, batizada
na Igreja Matriz de Curitiba em 29 de setembro de 1819, sendo seus padrinhos o padre
Antônio Teixeira Camello e Lourenço Pinto de Sá Ribas, “em ato administrado
pelo padre Thomé Alves de Castro” (1).
O
padre Camello ao falecer em 1847, com 63 anos, deixou em testamento “para uma
Santa Casa que fosse fundada” um imóvel junto à Igreja Matriz, na esquina da
rua Fechada (atual José Bonifácio) com a praça da Matriz (atual Tiradentes).
Esse imóvel seria ocupado pela sociedade Fraternidade Curitibana, antecessora
da Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de Curitiba, que ali atenderia
“indigentes e desvalidos” (2).
O
outro padrinho de Francisca, Lourenço Pinto, “exerceu o cargo de capitão-mor
/.../ Tomou parte ativa na vida política do 1º Império, sendo eleito membro do
Conselho Geral da Província de S.Paulo”, conforme Ermelino de Leão. Foi
deputado da Assembleia Geral em 1830-31 e 1832-33. Faleceu em 1840. Sua filha
Escolástica Joaquina casou-se com o brigadeiro Manoel de Oliveira Franco (3).
Sobre a vida de Francisca anterior ao
casamento com CJM, e sobre sua educação, não encontrei nenhum registro. Mas o
fato de ser neta do “mestre-régio” Manoel Teixeira e irmã (mais nova) de Rita
Ana de Cássia, a 1ª. professora do
ensino público de Curitiba, lhe proporcionou condições mais favoráveis e
estímulo para se instruir, em comparação com outras moças curitibanas de sua
época (v. adiante cartas redigidas por ela).
O casamento com CJM ocorreu em 21 de novembro
de 1840, na Matriz de Curitiba, como já foi dito. Dessa união, resultaram 10
filhos, 5 homens e 5 mulheres:
Alfredo Caetano Munhoz (1845-1921), Caetano
Alberto Munhoz (1847-1907), Luíza Munhoz (bat.1849-1886), Augusta Cândida
Munhoz Negrão (1851-1920), João Alberto Munhoz (1852-...), Carolina Munhoz
(1854-1933), Francisca Munhoz Viana (1856-...), Florêncio José Munhoz (1857-1909),
José Caetano Munhoz (1859-...) e Maria Leocádia Munhoz (1860-...) (4)
O zelo materno de Francisca é
revelado pelas cartas ao filho Alfredo, quando estudava no colégio “dirigido
pelo afamado professor Kopek”, de Petrópolis, reproduzidas no livro “Folhas Cadentes” (Elogio do Patrono), de
seu neto Alcides Munhoz (5). Aqui, abro
um parêntesis para dizer que, na realidade,
trata-se de Köpke e não Kopek, o nome do professor. Os irmãos Henrique e
Guilherme Köpke fundaram em Petrópolis, no ano de 1850, um estabelecimento considerado
modelar de ensino primário e secundário. Segundo Cláudia Panizzolo, o
estabelecimento era modelar não só pelo corpo docente e estrutura curricular
mas também pela arquitetura do prédio, da qual se encarregou Guilherme, que era engenheiro. A importância
do colégio foi destacada por Fernando de Azevedo em “A Cultura Brasileira” (6).
Transcrevo
abaixo duas cartas de Francisca não só para mostrar um pouco da psicologia dela
mas também da sua capacidade de expressão por escrito. E para mostrar a
linguagem que os pais usavam para dirigir-se
ao filho (tratam-no por “vós”). Seria esse modo formal de tratar o mais
adequado para uma carta, em meados do século XIX, ou decorria da influência portuguesa
sobre o meio?:
Meu
querido filho Alfredo.
Estimarei que esta vos encontre com saúde e
bastante adiantado nos vossos estudos; nós vamos passando bem, graças a Deus,
porém com muitas saudades vossas, e só o desejo que temos de que estudeis para
serdes alguma cousa para o futuro, nos obriga a estarmos tão longe de vós.
Nesta ocasião vos remeto 12 camisas de morim fino que estimarei fiquem de vosso
agrado, e mandai-me dizer se precisais camisas para dormir, para vos mandar.
Na
primeira ocasião vos mandarei uns doces que já estão prontos.
Mandai dizer se já fizestes algum exame de francês,
latim e mais alguma cousa, pois vós bem sabeis quanto apreciamos vossas cartas;
porém sempre nos dizeis a mesma cousa. Teus manos todos têm muitas saudades de
vós. Luizinha e Augusta (a) estão na escola de uma Sra. Bahiana que é bem boa
mestra. Caetano Alberto e Joãozinho (b) também estão na escola, e julgo que
vosso pai este ano não irá levar teu mano porque ainda está nas primeiras
letras.
Adeus meu querido filho; recebei um abraço
de vossa mãe e de cada um de vossos manos e manas; dai recomendações a vosso
respeitável mestre o Dr. Kopek que eu e vosso pai mandamos; e recebei a benção
de vossa mãe.
Curitiba
17 de março de 1859
Francisca
---------------------
(a) Luíza e Augusta, filhas de Francisca, tinham então 10
e 8 anos de idade, respectivamente.
(b) Os filhos Caetano Alberto e João Alberto
tinham então 11 e 6 anos.
Note-se
a sua preocupação com o estudo, inclusive das meninas.
A outra carta de Francisca que
consta em “Folhas Cadentes” é a seguinte (nessa época Caetano Alberto já é
também aluno do Colégio):
Meu querido filho
Alfredo.
Estimarei que esta vá encontrar vós e
Caetano com saúde, e bem adiantados em vossos estudos; nós todos vamos passando
bem, graças a Deus. Estimarei que já recebêsseis a marmelada que mandei; e
agora remeto para o vosso correspondente para vos ser entregue, um paletó
branco, que vosso tio Bento(a) vos manda; vai um chapéu, que mando para o
Caetano, vão 3 queijos grandes que mando para vós e vosso irmão; pelo outro
vapor mandarei os pêssegos. No dia 4 de fevereiro pp. fizestes 15 anos (b), e
nesse dia fiz doces para comermos com vosso pai e irmãos e sentindo que vós não
podêsseis participar deles. Estimo que vos divertísseis com a chegada do
Imperador e com as belas iluminações que lá fazem. Aqui chegaram 30 bugres
entre grandes, pequenos e mulheres, coroados, e vieram passear com o diretor
deles, e o Presidente mandou dar roupa, machado, foices e facas; eram muito
brutos, só comiam milho seco; e nem pão queriam. O Florêncio (c) ainda cá está
e por oras vosso pai precisa dele. Dei as lembranças que mandastes e todos vos
agradecem; vossa avó (d) vai indo como sempre; ora na cama, ora em pé; ela vos
agradece as vossas lembranças e igualmente vossa madrinha e padrinho (e). Vossa
avó vos lança sua benção e sempre reza
para que vós sejais feliz. Adeus meu querido filho; aceitai as nossas bênçãos e
que Deus vos faça feliz. Vossa mãe que muito vos estima—Francisca.
Quando
escreverdes mandai lembranças para vossa tia Balbina (f).
-----------------------------------
(a) Bento Florêncio Munhoz, irmão de CJM
(b) Alfredo nasceu em 4 de fevereiro de 1845. Fez 15
anos, portanto, em 15 de fevereiro de 1860. Assim, a carta é posterior a essa
data (e anterior a outubro de 1860, conforme item d abaixo).
(c) Florêncio, filho de Francisca, tinha apenas 2 anos e
alguns meses de idade nessa data, pois nasceu em 21 de dezembro de 1857, como
adiante se verá. Deve tratar-se portanto
de outro Florêncio, não deste seu filho. Poderia ser Florêncio Munhoz da Rocha,
sobrinho de CJM, filho de sua irmã Maria Lícia (cf. Francisco NEGRÃO-
“Genealogia Paranaense”- op. cit., v.I, p.256).
(d) D.Escolástica faleceria em outubro de 1860, conforme
foi dito acima. A outra avó, D. Luísa Lícia, já havia falecido, em 1857.
(e) Os padrinhos de Alfredo eram o comendador João de
Oliveira Franco (irmão de Francisca) e D. Maria Lícia Munhoz (irmã de CJM), que
casou com o português Manoel Martins da Rocha, pais do Cel. Bento Munhoz da
Rocha, dentre outros filhos.
(f) D. Balbina Lícia Munhoz era irmã de CJM. Casou com o
major Mathias Taborda Ribas, “comendador e importante industrial”, segundo F.
Negrão. A omissão das lembranças à tia, nas cartinhas de Alfredo, devia
estimular sua suscetibilidade...
No livro de Alcides Munhoz também consta
uma carta de CJM, transcrita a seguir, que bem revela o espírito prático do
pai, e sua contenção emocional (não chama o filho de “querido”, como a mãe, e
tem pressa de vê-lo “tratar da vida”,
mas revela cuidado com a saúde do filho, haja vista a ameaça da febre
amarela):
Alfredo
Esta serve de vos dizer que ficamos bons,
graças a Deus, e estimamos que vós e Caetano gozeis saúde, e que vos tenhais
vos adiantado. Quanto ao Caetano, que vá estudando, para depois ver o que ele
deve seguir, ou negociante, engenheiro, Dr. em leis, ou padre, aquilo para que
ele tiver mais jeito, porque mesmo hoje inda ele não sabe o que deve querer,
porque inda há pouco foi para o Colégio.
Jayme (a), de vossa tia Carlota, deve vir
para as férias de Dezembro, tempo em que hei de mandar vir vocês para esta,
para daqui irem juntos, pois vós sabeis que desejo muito que sejais Dr. em
leis, etc. como já temos conversado.
Consta-me que na Corte há febre amarela, por
isso não vos afligis em não irdes passear à Corte; em primeiro lugar a saúde,
não falta tempo de passear e cuidar em adiantar-se para logo começardes a
tratar da vida. Recebam a benção de vossa mãe e deste vosso pai.-- Caetano.
Curitiba, 9 de março de 1860. (7)
-----------------------------------
(a) Trata-se, na realidade, de James e não Jayme esse filho de D. Carlota Angélica de Oliveira e Souza, irmã de Francisca. Ele se
formaria pela faculdade de Direito de S.Paulo em 1864. Ver nota (8).
Note-se,
na carta de CJM, seu interesse em aproximar os primos, querendo que passem as
férias juntos em Curitiba, para seguir depois rumo às localidades onde se
situavam os estabelecimentos escolares que frequentavam (para fazer essa
viagem, embarcava-se em Paranaguá num navio a vapor com destino ao Rio de
Janeiro, com escala em Santos). James nascera em 1841, era portanto alguns anos
mais velho que Alfredo e Caetano Alberto. Devia estar, por isso, mais adiantado
nos estudos. Aparentemente, CJM queria que os filhos recebessem a influência
positiva dele, no sentido de que também adotassem o projeto de se tornarem
“Doutores em leis”.
Francisca, juntamente com outras senhoras,
cuidou do filho do Conselheiro Zacarias, quando ele estava doente. Em nota
publicada no “Dezenove de Dezembro” de 24 de janeiro de 1855, Zacarias agradece
ao Dr. Murici pelos cuidados que dispensou ao seu único filho, salvando-o de “uma
enfermidade mortal”, e também expressa sua gratidão a D. Francisca Cândida de
Assis Munhoz, D. Brazília Rita de Medeiros, D.Luduina d’Avila Carneiro e mme.
Ana Fere e à sra. Henriqueta Teixeira, “que velaram noites inteiras ao lado do
enfermo” (9).
O
filho de Zacarias devia ser ainda bebê de poucos meses, pois o pai veio para o
Paraná recém-casado (casara em 8 de outubro de 1853). Passara a lua-de-mel em
Paris (10). Imagino o
contraste de sensações experimentadas pelo casal, ao vir para cá, fazendo a penosa
travessia da Serra do Mar, por um caminho precaríssimo e perigoso, e passando a
viver depois num lugarejo pantanoso, assentado junto aos rios Ivo e
Belém...
A
nota acima revela a proximidade que havia entre Francisca e Carolina, a esposa
do Conselheiro Zacarias, que aliás era sua comadre, pois ela e o presidente da
província foram padrinhos de batismo de
uma filha sua, nascida em 1854 (a filha tomou inclusive o nome da madrinha).
A pesquisa bem documentada de Eremir Bley
Corrêa, além de citar datas de nascimento, batismo e morte dos filhos de CJM,
cita também o nome de seus padrinhos de batismo, informação útil para se
avaliar o círculo social de CJM. Assim, verifico que foram padrinhos, dentre
outros (excetuados os parentes), o presidente Zacarias de Góes e Vasconcelos e
sua esposa (padrinhos de Carolina), o comendador Manoel Gonçalves de Moraes
Roseira e esposa (padrinhos de Francisca), Manoel Antônio Guimarães e esposa
(padrinhos de Florêncio) e o presidente José Francisco Cardoso e esposa
(padrinhos de José Caetano), como se vê, pessoas da mais alta posição social na
Província.
O comendador Manoel Gonçalves de Moraes Roseira, segundo seu necrológio,
publicado no DD de 6 de julho de 1886- p.2, era "um dos mais importantes
fazendeiros desta província". E Manoel Antônio Guimarães (Barão e
depois Visconde de Nácar), um de seus maiores exportadores de erva-mate, como
vimos.
Todos os filhos homens, exceto José Caetano,
fizeram carreira no serviço público. Alfredo, Caetano Alberto e Florêncio foram
funcionários da Tesouraria de Fazenda ou das Alfândegas de Santos, Maceió ou
Paranaguá, órgãos do Ministério da Fazenda. João Alberto, dentre outras
ocupações governamentais, exerceu o cargo de diretor da Secretaria do Interior,
Justiça e Instrução Pública do Estado do Paraná. Quanto a José Caetano, ele foi
“importante negociante em Santos” segundo Francisco Negrão.
F.
Negrão foi a minha fonte primeira das informações sobre cada um dos filhos de
CJM que apresentarei a seguir, resultantes da sua união com D.Francisca, e
depois com D.Narcisa. Essas informações foram complementadas por mim, quando
possível, como resultado da pesquisa no jornal “Dezenove de Dezembro”, ou em
outra fonte, que se estendeu até o final da década de 1880, embora CJM tenha
morrido em 1877, pois aquele marco cronológico -- que assinala a abolição da
escravatura e a queda da monarquia -- representa o fim de uma época, a época de
CJM.
Acredito que a leitura “transversal” desses
tópicos sobre cada um dos filhos de CJM poderá auxiliar na caracterização e
compreensão da sociedade curitibana e provincial de seu tempo.
O primogênito de CJM, Alfredo
Caetano Munhoz, nasceu em 4 de fevereiro de 1845. Ocupou todos os postos da
carreira na Tesouraria de Fazenda nacional, até chegar ao de “Inspetor efetivo”
em 1878, com apenas 33 anos. Durante 1878-1879 foi Inspetor “em comissão” da
Tesouraria da Fazenda de Mato Grosso. Retornando ao Paraná, reassumiu seu cargo
de Inspetor efetivo da Tesouraria. Depois de aposentar-se, em 1889, “Exerceu
diversas comissões dentro e fora do estado, por nomeação dos governos
provincial e geral”, diz F. Negrão. Foi também relator dos debates do Congresso
Legislativo do Estado. Sabia várias línguas e redigiu “revistas e jornais, de
propaganda e literários”. Dentre os literários citam-se “Iris Paranaense”, que
fundou em 1873, juntamente com Luiz França, Faria Sobrinho, Júlio Franco e
outros, e “A Colmeia”, de 1898. Redigiu,
durante 14 anos, o quinzenário “A Luz”, que apareceu em 1890, órgão do Centro
Espírita de Curitiba. Casou-se duas vezes, a primeira com Rita de Assis de
Oliveira e após o falecimento desta, com Analia de Oliveira. Retirou-se então para
Porto Amazonas, e aí viveu 11 anos, entregando-se ao estudo da Botânica e da
História Natural. Faleceu em 1º de fevereiro de 1921 (11). É patrono da cadeira nº 11 da
Academia Paranaense de Letras (12).
Sua filha Francisca (v.
adiante, cap. 7) é referida muitas vezes no “Dezenove de Dezembro” como jovem
talentosa, aprovada com louvor nos exames preparatórios para o ingresso nos
cursos superiores do Império (que não existiam então no Paraná) e elogiada
pelos seus dotes artísticos, sendo aluna de Mariano de Lima. Ela se casou com Carlos Cavalcanti de
Albuquerque, oficial do Exército, que viria a ser presidente do Estado
(1912-16). Outros filhos de Alfredo foram o General Raul Munhoz (1875-1940) e o
2º Ten.Caetano José Munhoz (1882-1915). Este
homônimo do avô faleceu em combate na Revolta do Contestado, lutando pelo lado
legalista contra os caboclos despossuídos (uma morte heroica numa guerra
injusta!). Faleceu em 9 de janeiro de 1915 na tomada do Reduto Josephino,
quando se encontrava adido à 2ª. Companhia de Metralhadoras. Havia estudado na Escola
Preparatória e Tática do Rio Pardo, no Rio Grande do Sul, e em outras escolas
militares. Pertencia à arma de Infantaria. A partir de 1914, estava em
operações no Estado de Santa Catarina, com a 2ª. Brigada Estratégica. Foi
promovido a 1º Tenente post mortem “por
atos de bravura” (13). Tinha apenas 33 anos quando faleceu.
Em minha pesquisa no “Dezenove de Dezembro”, constatei que Alfredo Munhoz
é mencionado muitas vezes, assim como seu pai. Estas são as referências que
julguei mais interessantes incluir aqui, visando melhor caracterizar o contexto
social da época de CJM:
O jornal noticiou, no
começo de 1864, que Alfredo foi nomeado para o cargo de “praticante” da
Tesouraria de Fazenda. Antes disso, em 1863, ele foi admitido como “colaborador”
dessa Tesouraria, segundo seu sobrinho Alcides Munhoz (nesse tempo, funcionavam
juntas as tesourarias de fazenda do governo geral e provincial; mas com a
separação, ele vincula-se à Tesouraria geral, conforme o necrológio de Alfredo,
publicado em “A República” de 1º de fevereiro de 1921. Informa-se aí também que
ele foi nomeado seu “praticante” mediante concurso). Tinha assim 18 anos ao
iniciar a carreira fazendária, após retornar do Colégio Köpke de Petrópolis,
onde permaneceu 5 anos (entrou no Colégio aos 12 anos, ainda de acordo com Alcides).
Sua mãe falecera dois anos antes, em 1861.
A forma de acesso aos
cargos da Tesouraria era por concurso. O decreto imperial nº 2.549, de 14 de
março de 1860, declarava, em seu art. 1º, que
O provimento dos empregos de Amanuenses, e Oficiais das Secretarias das Tesourarias de Fazenda, de Praticantes, e das duas últimas classes de Escriturários do Tesouro Nacional, e das mesmas Tesourarias de Fazenda só poderá ter lugar por meio de concurso.
O provimento dos empregos de Amanuenses, e Oficiais das Secretarias das Tesourarias de Fazenda, de Praticantes, e das duas últimas classes de Escriturários do Tesouro Nacional, e das mesmas Tesourarias de Fazenda só poderá ter lugar por meio de concurso.
O decreto definia
também as matérias do concurso, que abrangiam prova escrita e oral. O
presidente da província nomeava examinadores, por matéria. O art. 18 afirmava
que “O concurso para preenchimento dos lugares vagos da classe imediata à de
Praticantes terá lugar entre estes” e o art. 19, que “O último concurso terá
lugar somente entre os empregados /.../ das Tesourarias de Fazenda /.../ da
classe imediatamente superior à de Praticantes”. Outro artigo previa demissão
para os Praticantes que não se submetessem ao concurso para acesso à classe
superior, ou fossem reprovados em dois concursos consecutivos.
Como se vê, não só o
acesso mas também a progressão na carreira fazendária dependia de concursos,
que, diferentemente do que ocorre hoje em dia, eram internos às repartições. A
legislação exigia não só a participação dos funcionários nesses concursos, mas
também a sua aprovação neles, sob pena de demissão...
Independentemente dos méritos
intelectuais de Alfredo, cabe perguntar até que ponto esses concursos eram para
valer. Alcides Munhoz relata o caso de um funcionário da Tesouraria, vindo de
uma província do Norte, que apesar da aparência enganadora era analfabeto! (14).
A posição social dos
candidatos, ou de seus padrinhos, certamente exercia influência sobre a sua
admissão e ascensão no serviço público (15).
Edições posteriores do
jornal informam a nomeação de Alfredo a “2º escriturário” em 1865, “oficial da
secretaria” em 1870 e “contador” daquela Tesouraria em 1873 (16). Em 1865, no início da Guerra do
Paraguai, o alferes Alfredo é nomeado também tenente da 2ª. companhia do 1º
corpo de cavalaria da Guarda Nacional, cujo comandante era CJM, como vimos (17). Em 1876, sua renda, como empregado
público, é de 2:400$000, conforme consta na lista geral dos cidadãos aptos a
votar da paróquia de Curitiba, organizada para atender ao disposto no decreto
nº 6.097, de 12 de janeiro de 1876 (18), que regulava o sistema eleitoral. No
Relatório do presidente Lamenha Lins apresentado à Assembleia Provincial em 15
de fevereiro de 1877 (19) constam dados sobre as despesas
realizadas nas colônias circunvizinhas da Capital, fornecidos pela Contadoria
da Tesouraria de Fazenda do Paraná, sendo mencionado o contador Alfredo Munhoz.
Este já dirige a Tesouraria de Fazenda interinamente, aos 31 anos, de 14 de
setembro de 1876 a
29 de janeiro de 1877. É elogiado no Relatório referido de Lamenha Lins nestes
termos: “por sua inteligência, probidade e amor ao trabalho soube manter o
conceito de que realmente deve gozar uma repartição desta ordem” (20).
1878 é o ano em que os
liberais assumem o poder, em 5 de janeiro, com o gabinete do Visconde de
Sinimbu. Em 23 de março, Rodrigo Octavio de Oliveira Menezes, do partido
Liberal, assume a presidência da província.
E em 8 de junho do mesmo ano, Alfredo é nomeado inspetor (efetivo) da
Tesouraria da Fazenda no Paraná. Mas três meses depois, em 6 de setembro, é de
novo nomeado, agora inspetor em comissão da Tesouraria de Mato Grosso (cf relatório
daquele presidente de 31 de março de 1879, p. 88). Permanece nesse cargo até
meados de 1879. Retorna ao Paraná e reassume, em 24 de novembro desse ano, a
inspetoria de sua Tesouraria, “continuando a recomendar-se por seu zelo,
atividade e inteligência, e merecendo assim toda a minha confiança”, como diz o
presidente Manuel Pinto de Souza Dantas Filho em seu relatório de 16 de
fevereiro de 1880, p. 69.
Alfredo exercerá o
cargo de dirigente da Tesouraria Nacional no Paraná por aproximadamente dez
anos, até 29 de junho de 1889,
quando entra em licença para tratar da saúde, aposentando-se a pedido em agosto
desse ano (21).
Na nota 22 menciono
todas as edições do jornal “Dezenove de
Dezembro” que publicaram editais da Tesouraria de Fazenda, ou se
referiram a Alfredo na condição de “inspetor” ou seja dirigente desse órgão do
Ministério da Fazenda na província do Paraná (o último desses editais foi
assinado em 9 de maio de 1889 e publicado no DD de 11 de maio desse ano, p. 3-4). Elas comprovam assim a minha assertiva. Mostram que sua permanência no cargo abrange
o período 1878-1889, e não apenas 1884-1887, como consta na parte histórica do
site da Secretaria da Receita Federal (23).
Em abril de 1883, o DD informa que foi concedida a Alfredo licença de
três meses para tratar de sua saúde (24), que ele só
vai gozar a partir de 28 de junho (25). Logo
depois, segue para a Corte
o digno e ilustrado inspetor da tesouraria de fazenda da província. Sr.
Alfredo Caetano Munhós /.../. Moço estimável e distinto por seu caráter e pelos
conhecimentos elevados da repartição que dirige /.../ Por seu critério e
aptidão reconhecidamente apreciados, ele tem feito um verdadeiro apostolado do
cargo que exerce; e por este motivo e com justiça goza da mais plena confiança
do governo quer provincial quer geral. (26)
Era época de domínio liberal, e por aí se vê que ele era prestigiado por
ambos os governos (apesar de membros de sua família serem vinculados ao Partido
Conservador). O comendador Antonio Alves de Araújo, vice-presidente em
exercício da presidência, manda lhe dar passagens (por conta do número delas a
que tinha direito o governo), para seu deslocamento de Curitiba até Antonina
(certamente via estrada da Graciosa, concluída em meados da década de 1870), e
depois, desse porto para o do Rio de Janeiro. No primeiro caso, a ordem foi
para Júlio Eduardo Gineste dar passagem em uma das suas diligências, e no
segundo, para o agente da companhia de vapores em Antonina. Ele
deveria dar passagem de 1ª classe a Alfredo no primeiro vapor que por ali
passasse, com destino à Corte (27). Regressa do
Rio de Janeiro em 16 de agosto (28), renunciando ao resto da licença a que
tinha direito, e reassume suas funções na Tesouraria de Fazenda (29).
No exercício do cargo
de inspetor da Tesouraria de Fazenda, de 1878 a 1889, Alfredo, funcionário de carreira,
atravessará governos liberais e
conservadores. Como vimos, de 1878
a 1885 (até 20 de agosto), os gabinetes do 2º Império são chefiados por liberais. De 1885 a 1889 (até 7 de
junho), os gabinetes são de conservadores (30).
Em 7 de junho de 1889 assume novamente um gabinete liberal, o último do
Império, com a consequente repercussão
no nível provincial. Logo depois, em 29 de junho, o DD informa que foi
concedida a Alfredo 6 meses de licença, com ordenado, para tratar de sua saúde (31). A licença assim se prolongaria
até o final de dezembro de 1889. Mas já em agosto de 1889 ele obtém a
aposentadoria solicitada, como vimos (32). A saúde não
deve ter sido o motivo real para o seu afastamento voluntário da Tesouraria.
Qual seria então o motivo? Talvez a conveniência política. Alfredo poderia
se sentir, agora, mais desconfortável, ao manter-se no cargo no novo período
liberal, testemunhando a clássica “derrubada” contra seus amigos conservadores
(embora fosse possível manter-se nele, uma vez que era “inspetor efetivo” e não
comissionado). Mas creio que o mais provável é que se cansara do serviço
público, excessivamente afetado pelos ventos políticos, ele que aos 44 anos
tinha ainda muita curiosidade intelectual e disposição para desenvolver os seus
projetos pessoais...
Rapidamente caracterizada a sua carreira profissional, apresento agora
referências na imprensa local, especialmente no “Dezenove de Dezembro”, relativas
a outros aspectos de sua vida, no período de tempo que nos interessa (até o
final do Império).
Durante a Guerra do Paraguai, como a força de linha estava toda
mobilizada, o tenente Alfredo Munhoz, da Guarda Nacional, prestou serviços como
os de ronda noturna da cidade de Curitiba, guarda de cadeia e no quartel dos “designados”,
em acréscimo às suas atividades profissionais rotineiras na Tesouraria de
Fazenda, o que lhe valeu elogio por parte do governo geral (cf. seu necrológio,
já referido, publicado em “A República” de 1 de fevereiro de 1921. Nessa mesma fonte,
consta que ele foi um dos fundadores das lojas maçônicas “Dezenove de
Dezembro”, “Apóstolo da Caridade” e da “Fraternidade Paranaense”, tendo
colaborado inclusive para o periódico “Jerusalem” desta última loja).
Alfredo e seu irmão Caetano Alberto são citados na matéria que o “Dezenove
de Dezembro” publicou em 27 de abril de 1870- p.4 sobre a recepção que
os curitibanos fizeram aos soldados que participaram da Guerra do Paraguai, os
chamados Voluntários da Pátria. Na edição do dia 30, p. 3, sob o título “Festejos”, consta matéria
mais extensa sobre essa recepção, e também a transcrição dos poemas de Caetano
Alberto (sem título) e Alfredo Munhoz (“Heróis comprovincianos”) alusivas ao
evento, que eles recitaram no Largo da Matriz (33). Os soldados
chegaram às 16 horas do dia 27 de abril comandados pelo “tenente Fabrício”,
acompanhados pela banda de música de Morretes, e alguns outros militares, “que
os foram receber a grande distância”. Ao meio-dia, sua aproximação foi
anunciada por tiros de artilharia e depois por foguetes, que partiam das torres
da velha Igreja Matriz. À entrada da cidade havia um arco com guarda de honra.
O chefe de polícia, demais autoridades e a comissão de festejos os aguardavam.
Foram saudados pelo chefe de polícia, o vigário Agostinho Machado Lima e o Dr.
Generoso Marques dos Santos. “Duas jovens galantes” os cobriram de flores e
recitaram poesias. Foram recepcionados no quartel de polícia, onde lhes foi
oferecida “magnífica refeição”. Alguns dos presentes lhes ergueram brindes.
Essa recepção prolongou-se até as 19 horas. Dali foram para o Largo da Matriz,
onde havia um pavilhão profusamente
iluminado e o povo se aglomerava. Após o hino nacional, Generoso Marques e o
padre Agostinho manifestaram-se novamente, além do “professor Costa”, Coriolano
Mota, Leocádio Pereira, que recitou uma poesia, como fizera o Dr. Generoso, e
também fizeram o Dr. Pedrosa, Alfredo Munhoz, Caetano Alberto e Gustavo de
Castro. Proferiram discursos ainda “Dr. Barros, capitão Previsto, Almeida
França e Dr. Faria Sobrinho”. As ruas da cidade foram iluminadas e nas janelas
de algumas casas “ondulava a bandeira nacional”. No dia seguinte, 28 de abril,
haveria um solene Te Deum em ação de graças. Depois, os Voluntários da Pátria
seriam recebidos na Câmara Municipal, onde lhes seria servido um “esplêndido
'lunch'”.
Ainda em 1870, o DD
informa o resultado da eleição, realizada em 20 de novembro, dos membros da
diretoria da sociedade “Concórdia
Curitibana” “que tem de servir no trimestre futuro”. O vice-presidente
eleito é Alfredo Caetano Munhoz. O presidente é Joaquim de Almeida Faria
Sobrinho (1847-1893), já citado acima, que era então promotor público da
comarca da capital (34); mais tarde, esse membro do Partido Conservador
será presidente da província, de 30
de maio de 1886 a
26 de dezembro de 1887 (35). Ainda com relação à “Concórdia
Curitibana”, o 1º secretário eleito é Francisco de Paula Ribeiro Vianna
(cunhado de Alfredo, pois era casado com sua irmã Francisca), o 2º secretário, Gabriel
da Silva Pereira Ribas e o tesoureiro, Manoel Fernandes Loureiro (36).
Alfredo também foi
membro de irmandades religiosas, como era costume então, nesse tempo em que a
“religião católica apostólica romana” era a religião do Império, o que constava
explicitamente no art. 5º da Constituição de 1824. Como se sabe, foi só com o
advento da República que o Estado passou a ser laico.
Em 21 de abril de 1872 realizou-se em Curitiba, em sua
Igreja Matriz, eleição dos novos
provedores e mesários da Irmandade do SS.
Sacramento para o ano de 1873. O tenente Alfredo Caetano Munhoz, então Chefe
de Seção da Tesouraria de Fazenda, foi eleito um dos 12 “mesários” (37). Dentre os 8 “provedores” escolhidos
consta o nome de seus tios major Bento Florêncio Munhoz, brigadeiro Manoel de
Oliveira Franco e comendador João de Oliveira Franco. Alguns anos depois,
Alfredo, já Contador da Tesouraria, foi eleito também um dos 8 provedores dessa
Irmandade, para o período 1876-77 (38).
Em dezembro de 1882, o DD informa que Alfredo
foi eleito um dos (agora) 12 provedores da Irmandade. Alguns dos outros
provedores: Dr. Joaquim Ignacio Silveira da Mota Jr (juiz de direito de S. José
dos Pinhais), Dr Ernesto Dias Laranjeira (juiz de direito da comarca de
Guarapuava), Dr. Generoso Marques dos Santos (deputado da Assembleia Geral),
major Luiz Manoel Agner (negociante), major Luiz Antonio Requião (coletor),
Miguel Miller (proprietário) (39).
Em 1884, os membros da Irmandade do SS. Sacramento são convidados
a comparecer dia 8 de setembro na Igreja Matriz de Curitiba “com suas
respectivas opas, para assistirem a missa solene e procissão da festa da
Padroeira” da cidade (40). E em abril de 1886, o DD publica a
"Relação dos irmãos do SS. Sacramento que têm de fazer a guarda do Senhor
na quinta-feira santa desde o meio-dia até ao meio-dia de sexta-feira da Paixão”.
Dentre os diversos pares de nomes, e respectivos horários, são citados o
tenente Alfredo Munhoz e seu cunhado major Manoel de Souza Dias Negrão, que
fariam a guarda na sexta-feira da Paixão, das 2 às 4 horas da manhã (41).
A respeito dessa antiga Irmandade do SS. Sacramento da Matriz de Curitiba
(cujos Capítulos foram aprovados em 1750), afirma o “Dicionário
Histórico-Biográfico do Estado do Paraná”:
Tratando-se de Irmandade com
objetivos assistenciais, além do pagamento da espórtula de 400 réis por todos
os Irmãos, as funções de diretoria eram também onerosas. Assim, o Provedor
deveria pagar 32$000, o Escrivão 16$000 e os Mesários, 2$000 (42).
Desse modo, à ascensão profissional de Alfredo corresponde uma ascensão
também nos postos que ocupa dentro dessa Irmandade, que, embora acarretasse um
ônus financeiro maior, lhe dava, em contrapartida, mais “status” social.
Alfredo participou também
de três outras irmandades: a de N. Sra da Luz, a da Misericórdia e a do Senhor
Bom Jesus do Perdão. A primeira, existente na Igreja Matriz de Curitiba, como a
do SS. Sacramento, também é bem antiga, pois passou a receber irmãos desde o
final de 1743, sendo seu Compromisso registrado no ano anterior (43).
Em 1873 Alfredo era um dos “irmãos mesários” da Irmandade de N. Sra da Luz, juntamente
com Agostinho E. de Leão, Generoso M. dos Santos, Bento A. de Menezes e outros (44).
Quanto à Irmandade de Misericórdia, ele foi um
dos eleitos em 30 de janeiro de 1876 para servi-la ao longo desse ano. Alfredo
servirá como “mordomo dos presos” enquanto seu tio Bento Florêncio Munhoz será
um dos 12 “mesários”. Na ocasião, foi reeleito provedor o Dr. José Cândido da
Silva Murici (45).
Alfredo Munhoz era membro ainda da mais recente Irmandade do Senhor Bom Jesus do Perdão, vinculada à igreja do
Rosário, da qual seu pai fora um dos instituidores e cujo Compromisso foi
aprovado pelo presidente José Joaquim do Carmo em 17 de março de 1864 (46). Caetano Alberto já era seu mesário em 1867-69. Para o ano 1884-85, foram
eleitos os “seguintes irmãos” como “festeiros e empregados”: Juiz- Tenente
Alfredo Caetano Munhoz. Juíza- D. Anna Antonia Torres de Freitas (segundo os
artigos 21 e 22 do Compromisso, o Juiz devia contribuir com 50 mil réis para a
receita da Irmandade, assim como a Juíza). Tesoureiro- Tenente-coronel Manoel
Euphrasio de Assumpção. Escrivão- Eulampio Rodrigues de Oliveira Vianna.
Procurador- João Baptista Gomes de Sá. Segue-se, na matéria do DD, a relação dos
nomes de 12 mesários (47). Todas as “dignidades eleitas” tomaram posse no dia
15 de agosto de 1884 (48).
O tesoureiro da Irmandade, tenente-coronel Manoel Euphrasio de Assumpção
(1827-1901), participou desde o início das atividades da força policial do
Paraná, criada pelo presidente Zacarias em 1854, da qual alguns anos depois se
tornaria comandante, cargo que exerceu até 1881. Participou da Guerra do Paraguai como
integrante dos Voluntários da Pátria. Era pai de Paulo de Assumpção, artista
plástico, e de Pamphilo de Assumpção, “um dos poucos doutores em direito
formados em São Paulo e que lá mesmo defendeu tese” (49). Pamphilo casou-se com Maria Amélia, também artista plástica, prima de
Alfredo (pois ela era filha do juiz Bento Fernandes de Barros e de D. Joaquina
de Oliveira Franco, filha por sua vez do Brigadeiro Franco, seu tio) (50).
Essa participação de pessoas importantes na comunidade em irmandades
religiosas é uma característica da época, e marca uma diferença bem
significativa com relação ao nosso próprio tempo.
Em julho de 1872, Alfredo
envolvia-se com a direção de outra sociedade local, nessa Curitiba ávida por
“civilizar-se”, e afastar de si o caráter provinciano que preocupava os
redatores da imprensa local. A cidade tinha então pouco mais de 12.600
habitantes, conforme o primeiro censo realizado no país, já comentado. O DD
informa quem são os membros do clube “Flor
do Paraná” que terão de servir no trimestre de julho a setembro. Alfredo
Munhoz, então com 27 anos, é novamente o vice-presidente (como no caso da sociedade
“Concórdia Curitibana” citada acima). O presidente é Tibúrcio Borges de Macedo (51). O Capitão Tibúrcio (1829-1877) era
filho do Ajudante (equivalente a Capitão) José Borges de Macedo, membro do
Partido Liberal, que ocupou vários “cargos da governança” e foi o primeiro
prefeito de Curitiba (52).
Na ata da sessão da nossa Câmara Municipal de 27 de janeiro de 1873, consta que Alfredo, João Baptista
Ribeiro e Dr. Sérgio Francisco de Souza Castro pediram
que a Câmara em prazo
curto obrigasse os seus vizinhos a terraplenar e nivelar antigo leito do rio
Ivo, visto ter-se tornado um receptáculo de águas estagnadas e imundícias que,
sob a influência dos raios do Sol, exala miasmas pestilenciais, tornando-se
assim um foco de enfermidades que costumam grassar nesta cidade.
A Câmara resolveu
nomear uma comissão composta de um médico e um engenheiro para opinar sobre o
assunto (53).
Sérgio de Castro
(1840-1921) era um advogado militante que havia se formado em 1861 pela
faculdade de Direito de São Paulo. Retornando ao Paraná, foi nomeado secretário
da polícia da província, oficial da sua secretaria do governo e diretor geral
da Instrução Pública. Na época daquela solicitação à Câmara, em 1873, já havia
sido deputado à Assembleia Provincial do Paraná por dois biênios (1864-65 e 1868-69). E logo
seria eleito deputado para a Assembleia Geral, em 1876, sendo reeleito em 1878 (54).
Três anos mais tarde, o
DD de 5 de fevereiro de 1876- p.4
publica edital da Câmara em que ela resolve
mandar proceder ao
dessecamento dos banhados existentes atrás da rua do Comércio desde os fundos da casa do Sr. tenente
Alfredo Munhós até a travessa da rua do Riachuelo.
Para a realização desse
serviço, a Câmara quer receber propostas “em carta fechada”. Por aí se vê que a
residência de Alfredo localizava-se na rua do Comércio, atual rua Marechal
Deodoro, em Curitiba (que também foi chamada, no tempo da monarquia, de rua do
Imperador).
No DD de 5 de setembro
de 1877- p. 3 consta a seguinte
nota, mostrando a precariedade dos aparelhos de estado da época:
SECRETARIA
DO GOVERNO- Acha-se funcionando atualmente esta repartição na casa do Sr.
Alfredo Caetano Munhós, à rua do Comércio.
Por uma outra edição do
jornal, de 1877, verificamos que os filhos de CJM tinham ligações com a Maçonaria
(já vimos que em 1870 Alfredo participou da direção da sociedade “Concórdia
Curitibana”). Alfredo Munhoz e Caetano Alberto
discursaram, juntamente com outros (inclusive o Dr. Faria Sobrinho), na
cerimônia de regularização da loja maçônica “Concórdia 4” , “composta de alemães residentes nesta capital”,
realizada na casa do Sr. Wolf, no Alto de S. Francisco (55). Esse “Sr. Wolf” deve ser o austríaco Fredolin Wolf, que
construiria nessa mesma região da cidade, alguns anos depois (em 1880), o
palacete da praça Garibaldi, hoje administrado pela Fundação Cultural de
Curitiba. A propósito, o site dessa Fundação também informa que em 1914 o andar
superior do imóvel foi ocupado pela Loja Maçônica de Curitiba (56).
Segundo o “Dicionário
do Brasil Imperial”, o país atravessara no período 1872-75 a chamada “Questão
religiosa”, na qual se tornaram críticas as relações entre a Igreja Católica e o
Estado devido principalmente à atuação de alguns bispos que, seguindo a
orientação papal, condenavam a Maçonaria, considerando-a incompatível com a
religião católica. D. Vital, bispo de Olinda, interditou “duas capelas de
irmandades que se recusavam a expulsar os confrades maçons”. Posteriormente,
ele suspendeu das ordens o deão da catedral, “próximo da Maçonaria e líder do
Partido Liberal na província” (de Pernambuco), assim como mandou publicar “um
breve papal, que ordenava aos bispos do Brasil a dissolução das irmandades infestadas pela Maçonaria”. Mas sua
atitude ia contra a Constituição brasileira, segundo a qual as decisões da
Igreja, para serem executadas aqui, deviam ser submetidas à aprovação do Estado.
Por outro lado, as associações, por serem leigas, não podiam ser extintas “sem
a anuência do poder civil”. Assim, os conservadores, então no poder, afirmavam
que o breve papal era “uma intervenção nos assuntos do país por um monarca
estrangeiro” e propunham o rompimento de nossas relações diplomáticas com a Santa Sé. Em conseqüência de um
processo movido contra D. Vital, e também D. Antônio, bispo do Pará, cujo comportamento
era semelhante ao seu, ambos os bispos chegaram a ser presos, julgados e
condenados a cumprir pena. A Maçonaria tivera um papel importante na história
do Brasil desde o começo do século XIX, quando as primeiras lojas foram criadas
aqui, contando com personalidades que contribuíram para a independência do país,
e outros eventos políticos importantes. Contava também com a participação de
sacerdotes. A crise -- dada as polêmicas travadas na imprensa e as notícias
relacionadas ao tema -- sensibilizou a população. Encerrou-se com a comutação
da pena e a anistia aos bispos concedida pelo Imperador. Entretanto, os historiadores
consideram que essa crise desgastou a imagem da monarquia junto ao povo (57).
O fato de Alfredo e seu
irmão Caetano Alberto, respectivamente com 32 e 30 anos, participarem da Maçonaria
revela independência de espírito e adoção da
atitude nacionalista desta, contrária à postura ultramontana da Igreja, que
buscava subordinar-se diretamente ao Vaticano, em detrimento do Estado brasileiro,
cuja religião oficial, todavia, continuaria a ser o Catolicismo até o fim do
Império.
Em 1880 Alfredo Caetano Munhoz é um dos 17 membros que integram a
comissão "para promover os meios e preparar a recepção de Suas Majestades
Imperiais em sua próxima visita a esta província". Tratava-se da visita do
imperador D. Pedro II, da imperatriz e sua comitiva, que chegaram ao porto de
Paranaguá em 18 de maio de 1880 (58). Outros
nomes da comissão: Dr. Sérgio Francisco de Souza Castro, Dr. Agostinho Ermelino
de Leão, Dr. Joaquim de Almeida Faria Sobrinho, Dr. João José Pedrosa,
Ildefonso Pereira Correia (que receberia o título de Barão do Serro Azul em 1888)
(59). As atividades de SS.MM.II. (Suas Majestades
Imperiais) em Curitiba abrangeram a inauguração do hospital da Santa Casa (em
22 de maio), visita a algumas colônias, contatos com representantes da
Assembleia Provincial e também de diversas câmaras municipais (60). Depois
visitaram Campo Largo, Palmeira e Ponta Grossa (61). O “Dezenove
de Dezembro” informa também que o Imperador partiria para Morretes no dia 3 de
junho, dia 4 estaria em Antonina, dia 5 em Paranaguá, onde seriam inaugurados
os trabalhos da estrada-de-ferro, embarcando depois SS.MM. para a corte. Em
Antonina, hospedaram-se na casa do comendador Antônio Alves de Araújo (62) e em Paranaguá, na do comendador Manoel Antônio Guimarães, Barão de
Nácar desde 1876 (63).
Quatro anos e meio mais tarde, quando da visita do Conde d'Eu e da
princesa Isabel ao Paraná, no final de 1884, para inaugurar a estrada de ferro
Curitiba-Paranaguá, Alfredo é novamente designado, certamente por ser o
dirigente da Tesouraria da Fazenda, para integrar a “comissão encarregada dos
festejos a SS.AA. (Suas Altezas) Imperiais”,
composta por 21 membros. O presidente da comissão é o Dr. Agostinho Ermelino de
Leão, o vice-presidente comendador A. Martins Franco, o secretário A. D. de
Barros, o tesoureiro José Hauer e o procurador, A de Assis Teixeira (64). Diz o “Dicionário Histórico-Biográfico do Estado do Paraná”: “A 19 de dezembro de 1884, chegou o primeiro trem de Paranaguá a Curitiba.
Dias antes, a 29 de novembro, a Princesa Isabel, com a sua comitiva,
desembarcava no Atuba” (65).
Em 1880, segundo o DD de 4 de agosto, p. 3, o Dr. João José Pedrosa
ofereceu em sua casa um jantar ao Dr. Manuel Pinto de Sousa Dantas Filho,
presidente da província que estava deixando o cargo (sendo substituído pelo
primeiro; ambos do Partido Liberal). O "serviço correu profuso e delicado,
demorando-se entre 4 e 7 horas da tarde". Dentre os brindes trocados na
ocasião, a matéria menciona o do Dr. Dantas Filho a Alfredo Munhoz, "um
dos caracteres mais dignos, e um dos auxiliares mais eficazes da administração
como inspetor da tesouraria de fazenda". O Dr. Pedrosa, segundo David
Carneiro, “foi o primeiro paranaense a governar, por nomeação direta do governo
imperial, a sua província de nascimento” (66). Durante sua gestão, Alfredo foi
um dos três nomeados por ele para integrar comissão "a fim de agenciar
donativos para a construção de uma capela no cemitério público desta
capital". Os outros nomes citados são o comendador Ildefonso Pereira
Correia (futuro Barão do Serro Azul) e o tenente-coronel Benedito Enéas de
Paula (67). Em seu relatório de 16 de fevereiro de 1881, p.54-55,
o presidente João José Pedrosa justifica tal atitude pela falta de condições
financeiras da província para atender a essa demanda social. Ele incumbiu o
engenheiro Gottlib Wielland de elaborar a planta da obra e seu orçamento. E
encarregou o tenente-coronel Antonio
Ricardo Lustosa de Andrade de dirigir a sua execução, “recebendo da comissão
indicada o produto dos donativos que forem agenciados” (o tenente-coronel
Lustosa de Andrade -- tio de Alfredo, pois casara com uma irmã de sua mãe -- já
estava encarregado das obras da igreja da
Ordem Terceira de S. Francisco das Chagas -- cf. também relatório do presidente
Sancho de Barros Pimentel de 26 de janeiro de 1882, p. 16).
Quando o presidente vai deixar o cargo, em 1881 -- após seu breve mandato
à frente dos negócios da província, como ocorria com frequência no tempo do
Império --, Alfredo é uma das pessoas que integram a "comissão de
convites" para o baile oferecido ao Dr. Pedrosa "pelos seus amigos e
apreciadores" no dia da posse do novo presidente da província (68). Outros nomes que integram a comissão: Drs. Manoel Alves de Araújo,
Sérgio Francisco de Souza Castro, Agostinho Ermelino de Leão, comendador
Antonio Martins Franco.
O Dr. Pedrosa morreria prematuramente. Numa edição de maio de 1882, o DD
informa (69) que o presidente Dr. Carlos Augusto de Carvalho, o Dr.
José Joaquim Franco Valle e Alfredo Munhoz mandaram celebrar missa na Igreja
Matriz pela sua alma. João José Pedrosa morrera de tifo no Pará, onde ocupava o
cargo de presidente da província. Tinha apenas 37 anos. Já havia
exercido o mesmo cargo na província de Mato Grosso em 1878-1879 (e não em 1875,
como consta na obra citada acima, de David Carneiro) e no Paraná, em
1880-1881. Assumiu a administração da província de Mato Grosso em 6 de julho de
1878 (70), enquanto Alfredo, nomeado inspetor (em comissão) de
sua Tesouraria de Fazenda por um decreto de 6 de setembro desse ano, assumiu o
cargo logo depois, em 2 de novembro. Permaneceu em Cuiabá pouco mais de 8
meses, até 12 de julho de 1879, quando foi dispensado, a pedido, do cargo (71). Assim, a relação de trabalho entre os conterrâneos, residentes nessa
outra província do Império, deve ter contribuído para criar uma grande amizade
entre os dois. Ao deixar a inspetoria, Alfredo recebeu uma carta elogiosa do
presidente João José Pedrosa, datada de 10 de setembro de 1879, em que o chama
de “modelo de empregado pela dedicação ao serviço” e “pela lealdade e
imparcialidade com que soube desempenhar as funções do cargo”. A carta consta
do livro “Folhas Cadentes”, de Alcides Munhoz (p.34-35).
Após deixar a presidência da província, e antes de assumir a do Pará,
João José Pedrosa foi inspetor da Tesouraria Provincial, conforme registra o
presidente Sancho de Barros Pimentel em seu relatório de 26 de janeiro de 1882,
p. 25. Ele atuou assim numa área afim à de Alfredo, que representava aqui a
Tesouraria de Fazenda Nacional, o que deve ter reforçado ainda mais as relações
de amizade entre ambos.
Quatro anos depois do falecimento de Pedrosa, em 1886, Alfredo ainda convida
para a missa que ele e Ignacio Alves C. Carneiro mandaram rezar, na Igreja Matriz,
pela alma "de seu prezadíssimo e sempre lembrado amigo dr. João José Pedrosa"
(72).
Nota no DD de 1º de setembro de 1880- p. 4 fornece informações sobre os
cidadãos da província que foram agraciados com títulos de visconde, barão e
condecorações (Comendador, Oficial da Rosa, Cavaleiro da Rosa e Cavaleiro de
Cristo). Alfredo Munhoz recebeu a condecoração de "Cavaleiro da Ordem da Rosa" juntamente com o Dr. Generoso
Marques, major Luiz Manoel Agner, Mariano Torres, A. Stellfeld e outros. Ele
foi condecorado por um decreto de 31 de agosto de 1880 (73). No final deste ano, o DD publica nota assinada pelo "coletor das
rendas gerais desta capital" Luiz Antonio Requião comunicando aos
interessados que se acham na sua repartição ("a fim de serem
solicitadas") as cartas pelas quais os nomes que arrola foram agraciados
com os diversos graus das ordens da Rosa e de N. Sr. Jesus Cristo. Dentre os
citados com o grau de "cavaleiro" da Ordem da Rosa consta o nome de
Alfredo Caetano Munhoz (74).
Em 1883, Alfredo Munhoz é um dos integrantes da comissão
instituída pelo presidente da província Oliveira Bello para dar continuidade à
construção de casa escolar na rua Aquidaban (atual Emiliano Perneta). As obras
dessa casa foram iniciadas pelo presidente anterior (Carlos A. de Carvalho- v.
adiante). Elas receberão 40% do imposto predial do município de Curitiba, mas
os recursos são insuficientes. Por isso, para levantar fundos, nomeou-se essa
comissão, formada por 23 pessoas importantes da comunidade, que deverá "promover leilões
de prendas, concertos e bailes nos salões do Museu", a cargo do Dr. Agostinho
Ermelino de Leão. Além deste, também integram a comissão, juntamente com
Alfredo, os comendadores Antonio Alves de Araújo e Ildefonso Pereira Correia, o
Dr. Emygdio Westphalen e o Dr. Generoso Marques dos Santos, dentre outros (75).
No final do ano, o presidente Oliveira Bello, após
autorização da Assembleia Provincial, decide instituir aqui o ensino
obrigatório. Expede, em 3 de dezembro de 1883, um Regulamento que organizava tal
ensino e continha as seguintes disposições (além de prever sanções e multas
para os infratores): cada
cidade, vila ou povoação da província constituiria uma circunscrição escolar,
cuja área seria dividida em distritos, identificado por um número. Cada
distrito ficaria a cargo de um “superintendente”, chamado “do ensino obrigatório”.
Esses superintendentes formariam uma comissão, chefiada por um deles. Aos
superintendentes competia, ainda de acordo com o citado Regulamento: “fazer o
arrolamento da população escolar; fiscalizar a frequência; promover à
assiduidade os alunos remissos; impor multas; verificar a necessidade da
prestação de roupas aos indigentes etc”. A frequência escolar era obrigatória
entre 7 e 14 anos de idade. Oliveira Bello informa ainda em seu relatório de 22
de agosto de 1884, p. 39-40 -- fonte
dessas informações -- que já haviam sido fundadas 17 circunscrições, abrangendo
toda a Província. Após a instituição do ensino obrigatório na 1ª circunscrição
de Curitiba (e em outras circunscrições) tinha havido, segundo ele, um aumento
significativo do nº de matriculados.
Alguns meses antes, em janeiro de 1884, o DD (76) afirmara que a circunscrição da Capital fora dividida em 14 distritos
escolares para o estabelecimento do ensino obrigatório. O presidente da
província nomeara 14 cidadãos para serem superintendentes desses distritos. O
11º ficou a cargo de Alfredo Munhoz, com a seguinte abrangência: ruas do
Aquidaban, do Imperador (onde Alfredo morava, atual Marechal Deodoro) e Largo
do Conselheiro Zacarias. Os cidadãos foram sugeridos ao presidente pelo
"chefe da superintendência do ensino obrigatório da circunscrição da
capital", o Dr. Generoso Marques dos Santos. Também eram superintendentes,
dentre outros, Dr. Emygdio Westphalen, Ten-cel Benedito Enéas de Paula, Cap.
João Baptista Brandão de Proença, Comendador Ildefonso Pereira Correia e o Dr.
Agostinho Ermelino de Leão. Nas circunscrições de ensino, os alunos
distribuíam-se por escolas públicas, subvencionadas, particulares ou
"recebem ensino em casa" (77). Cobrava-se
efetivamente multa de quem não matriculasse as crianças no prazo legal, pois um
cidadão pediu relevação da multa que recebeu por não ter matriculado "o
ingênuo Júlio, filho da escrava Iphigenia" (78). Nota
publicada no jornal de 30 de maio de 1884 (79), sob o
título "Ensino obrigatório", refere-se às visitas às escolas dos 11º
e 13º distritos, feitas pelos superintendentes Alfredo Munhoz e capitão Jorge
dos Santos. Uma delas foi a de D.Narcisa Paula Xavier Munhoz (madrasta de
Alfredo, viúva de seu pai, de quem foi a 2ª esposa). O relatório citado do presidente Oliveira
Bello, na p. 51, informa que a escola de D. Narcisa contava 84 alunas
matriculadas, sendo frequentada por 81. Sua escola, apenas do sexo feminino,
era uma das cinco “subvencionadas” da 1ª circunscrição, que abrangia duas do
sexo feminino e três promíscuas. O mesmo relatório informa, na p.50, a
existência de 25
estabelecimentos de ensino primário (escolas públicas, subvencionadas e
particulares) na 1ª circunscrição, que abrangiam 1.514 matriculados.
Adicionando-se os 65 que “aprendiam em casa”, chega-se ao número total de 1.579
alunos, bem mais do que as 1.289 crianças sujeitas ao ensino obrigatório do
arrolamento inicial feito em dezembro de 1883, quando foi expedido o
Regulamento relativo a tal ensino. Daqueles 25 estabelecimentos de ensino
primário, somente 3 ministravam também
ensino secundário. Estes eram os colégios particulares Santa Tereza, Partenon e
Curitibano.
Em 22 de agosto de
1884, data do relatório de Oliveira Bello, já havia 16 distritos na 1ª
circunscrição, da Capital, cujo chefe das superintendências era agora o Dr.
João Pereira Lagos. Ao final do seu relatório (anexado ao do presidente, como
os de outras circunscrições), destaca o empenho de cinco nomes, o primeiro dos
quais é o do “Sr. Munhós”. Alfredo, como
já foi dito, era responsável pelo 11º distrito. Ao seu tio, tenente-coronel
Antonio Ricardo Lustosa de Andrade, coube o 1º distrito (cf relatório citado do presidente Oliveira
Bello, p. 53).
O ensino também passou a ser obrigatório no interior da província,
seguindo os mesmos procedimentos definidos no respectivo Regulamento (80).
Na gestão de Oliveira Bello, o comendador Antonio Alves de Araújo, o Dr.
Agostinho Ermelino de Leão e Alfredo Caetano Munhoz foram encarregados pelo
presidente de “coligir os elementos com que esta província tem de figurar na
exposição inglesa de higiene e de educação, que em maio próximo deve efetuar-se
em Londres" (81).
Ainda no relatório do presidente Oliveira Bello
de 22 de agosto, p. 95-96 -- que foi apresentado ao passar a administração ao
seu sucessor -- consta um tópico sob o título “Desfalque no Correio” (esse registro
pareceria estranho hoje num relatório de governante, que não se exporia assim
ao apontar irregularidades de sua gestão). Oliveira Bello reproduz parte do
relatório do inspetor da Tesouraria de Fazenda Alfredo Caetano Munhoz sobre
esse desfalque, prontamente levado ao seu conhecimento. A arrecadação do
Correio de março de 1884 deveria ser recolhida à Tesouraria até o dia 10 de
abril. Seu Administrador alegou estar doente e não fez o recolhimento, no valor
de 36:776$310. Posteriormente, foram levantados naquela repartição 23:548$130,
logo recolhidos à Tesouraria. Como o Administrador não recolhera o restante, fora
preso e seus bens sequestrados, até que satisfizesse seu “alcance” para com a
Fazenda Nacional.
O DD de 28 de setembro de 1884- p. 3 contém artigo assinado por “A.Munhós” sob o título “Ao 28 de Setembro”.
Essa edição do jornal homenageia o Visconde do Rio Branco (do Partido
Conservador) pela lei do Ventre Livre -- sancionada nesse dia, em 1871 -- e o novo
presidente da província, Dr. Brasílio Machado (do Partido Liberal), pelos
esforços de seu governo na área da educação. Estes são os temas do artigo de
Alfredo, que preferia assim posicionar-se equidistante das duas opções
partidárias. Ele se associa “às expansões que hoje se traduzem em popular
regozijo”, comemorando os “dois fatos gloriosos”.
Brasílio Machado é aquele presidente que logo depois, a partir de novembro do mesmo ano, irá perseguir politicamente
Florêncio, irmão mais novo de Alfredo e seu subordinado na Tesouraria de
Fazenda, por um comentário crítico dele relativamente aos esforços do
presidente para eleger o seu candidato na campanha para deputado da Assembleia
Geral Legislativa (v. adiante). Pelo menos essa foi a opinião de Manoel
Euphrasio, líder do Partido Conservador, que combateu a lei do Ventre Livre...
No dia seguinte, 29 de setembro, os festejos incluíram inauguração da
escola Oliveira Bello e a entrega ao presidente Brasílio de um Livro de Ouro
(onde eram “lançadas as libertações”).
Quanto às escolas públicas, é interessante assinalar que até o governo do
presidente Carlos A. de Carvalho, conforme seu relatório de 1º de outubro de 1882,
p.89, a província não possuía nenhum edifício escolar. Todos eles eram
alugados. Em 1882 ele
manda construir, basicamente com recursos de donativos, a primeira casa
escolar, num terreno na rua Aquidaban que lhe foi cedido pelo comendador
Antonio Martins Franco. Informa ainda nesse relatório que na mesma rua, em um
terreno oferecido pela viúva do brigadeiro Manoel de Oliveira Franco (D.
Escolástica Joaquina de Sá Ribas Franco), mandou começar a construção de escola,
essa só para meninas, a ser financiada “com donativos das senhoras paranaenses”.
Como era costume nessa época, enquanto a primeira obra ficou sob a direção do
capitão Evaristo Cícero de Moraes, encarregou-se da administração dessa última
o tenente-coronel Antonio Ricardo Lustosa de Andrade, tio de Alfredo. O próximo
presidente, Oliveira Bello, em seu relatório de 22 de agosto de 1884, p. 49, afirma
que já estava concluída a construção dessa “casa escolar”. Embora o
tenente-coronel Lustosa de Andrade tivesse empenhado “ingente esforço em
ultimá-la”, Oliveira Bello, entretanto, não poderia inaugurá-la “por ter
urgência de seguir para o Rio de Janeiro”. Deve ser essa escola aquela,
referida acima, que foi inaugurada pelo presidente Brasílio Machado e tomou o
nome de seu antecessor.
Nos festejos de 29 de setembro de 1884, o presidente Brasílio discursou e
leu 68 cartas de liberdade. O DD publica relação dos nomes dos “generosos
cavalheiros que as concederam, assim como o dos escravos libertos”. Dentre
eles, consta o de Alfredo Munhoz, que libertou, “com indenização”, a escrava Florinda.
Dos 30 proprietários de escravos citados, só 3 deles foram indenizados (82). Conforme outra edição do DD (83), “extinguir o elemento servil
por meio de indenização” era a posição de Manoel Euphrasio, que o jornal critica,
pelo seu alto custo para o país: 600 mil contos de réis! (o jornal, em seu
cálculo, considera 500$000 o valor médio de um escravo nessa época (84). Assim, a postura de Alfredo, na prática, ao libertar a escrava “com
indenização” era a mesma dos conservadores. Também o “Futuro” de 13 de junho de
1885- p. 1 transcreve discurso do deputado (da Assembleia Geral) Manoel
Euphrasio Correia, em 21 de maio desse ano, posicionando-se contra o projeto do
ministério Dantas, do Partido Liberal, que estabelece “a libertação dos sexagenários
sem indenização”. Ele defendia a “legitimidade e a legalidade da propriedade
escrava”...
Alfredo foi uma das autoridades que viajaram a Paranaguá, juntamente com
o 1º vice-presidente Joaquim d'Almeida Faria Sobrinho, para receber, em 26 de
agosto de 1885, Alfredo
d'Escragnolle Taunay, que logo depois assumiria a presidência. No Club
Literário, Taunay fez discurso a favor da imigração, “como base principal para
o progresso da pátria”. Atendendo ao seu apelo, criou-se uma sociedade com o
propósito de incentivá-la e apoiá-la em Paranaguá, presidida pelo Visconde de
Nácar. Taunay, que era do Partido Conservador (85), foi
presidente da província de 29 de setembro de 1885 a 3 de maio de 1886.
Ele deixou o cargo por ter sido eleito deputado da Assembleia Geral Legislativa
(ou Câmara dos Deputados) pelo 1º distrito de Santa Catarina. A administração
da província retorna assim ao vice-presidente Faria Sobrinho (86).
Em 1885, Alfredo Munhoz era um dos membros da Sociedade Dramática Atheneu Militar (antes S.D.M. Atheneu de
Guerra) (87). Anúncio que consta no DD de 1º de dezembro desse
ano, p. 3, informa que será encenado no teatro S. Theodoro o drama "O
soldado brasileiro", de Ubaldino do Amaral e C. Barata, promovido pela
S.D.P. Atheneu Militar (S.D.P devia significar Sociedade Dramática
Particular, sigla usada também para uma outra sociedade da época (88). Logo
depois, a sociedade de que Alfredo era sócio levaria à cena um drama ("A
escrava de Guadalupe ou A honra do marinheiro"), em 5 atos, e uma
"chistosa" comédia em 1 ato ("Rato 22- 3º esquerdo"),
conforme anúncio do teatro S. Theodoro, publicado no jornal (89). Os "sócios de camarotes" são alertados de que o sorteio será
realizado "amanhã, sábado" (aparentemente, ocorria aqui o mesmo que
em outros casos: havia “sócios de camarotes” e “sócios de cadeiras”).
O teatro S.Theodoro fora inaugurado no ano anterior, em setembro de 1884.
Quem ali encenou a primeira peça foi justamente a Sociedade Dramática Militar
Atheneu de Guerra referida acima. O teatro, cujo nome mudou para Guaíra
em 1900, localizava-se na rua Nova (atual Dr. Muricy) em Curitiba. Foi demolido
em 1947 e em seu lugar construiu-se o prédio da Biblioteca Pública do Paraná (90).
Em 7 de dezembro de 1886 realizou-se no Museu Paranaense uma
reunião onde foram aprovados os estatutos de uma sociedade científico-literária
a ser criada chamada “Arcádia Paranaense”.
Sua diretoria ficou assim constituída (91): Presidente:
padre João Evangelista Braga (Vigário Geral Forense da província) (92). Vice-presidente: comendador Manoel Ricardo Carneiro. 1º Secretário: Leôncio
Correia. 2º Secretário: major Dr. Saturnino N. Cardoso. Tesoureiro:
comendador Alfredo C. Munhoz (assim chamado por ter recebido uma comenda, ou
condecoração, da Ordem da Rosa). Orador oficial: José Francisco da Rocha Pombo
(então deputado da Assembleia Provincial, pelo Partido Conservador; Rocha Pombo
(1857-1933) se mudaria depois para o Rio de Janeiro, tornando-se um
historiador famoso e chegando a ser eleito membro da Academia Brasileira de Letras).
Arquivista: Joaquim Serapião do Nascimento. A instalação solene da sociedade
ocorreria no dia 19 de dezembro de 1886, 33º aniversário da emancipação
política da província do Paraná. Depois, edital publicado no DD informa que a
Arcádia Paranaense conta com 43 sócios fundadores efetivos. A composição da
diretoria é republicada nesse edital, esclarecendo que o 2º Secretário era
tenente e não major, que o Diretor da Revista da Arcádia era Nivaldo Teixeira
Braga (irmão do padre João Evangelista Braga) (93) e que o 1º
presidente honorário era o presidente da província Joaquim de Almeida Faria
Sobrinho. O objetivo da Arcádia Paranaense era "estudar e coordenar todos
os elementos de sua grandeza (i.e. da grandeza do Paraná) e fazê-los conhecidos
do mundo". Um ano depois, em 19 de dezembro de 1887, a Arcádia Paranaense
realizou uma sessão magna, em que todos os oradores referiram-se à "causa
santa" da libertação dos escravos. O presidente da Câmara Municipal,
comendador Ildefonso Correia, atendendo um apelo de Leôncio Correia, declarou
que iria envidar esforços para que nessa mesma data, no ano que vem, "se
festejasse a libertação do Paraná todo ou ao menos de Curitiba" (94). Chegada essa data, o DD de 19 de dezembro de 1888- p.2 informa que a
Arcádia comemoraria numa sessão magna naquele mesmo dia a emancipação do Paraná.
Como a sanção da Lei Áurea ocorrera em 13 de maio passado, nesse ano, o
comendador Ildefonso e o escritor Leôncio Correia viram a sua aspiração
concretizada...
Sobre a Arcádia afirmaria Rocha Pombo em “O Paraná no Centenário”:
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